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    Arquivo: Edição de 30-11-2018

    SECÇÃO: Crónicas


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    PASSEIOS DE BICICLETA À DESCOBERTA DO PORTUGAL REAL…

    “Que verguenza!"

    Andando às voltas por Espanha, descobri a majestosa Ávila. As muralhas acasteladas da antiga cidade, as suas ruas limpas e seus monumentos conservados, como se tivessem acabado de ser feitos.

    Veio-me à memória o que percorri e vi por este Portugal em junho do corrente ano. Sim, em 3 de junho percorri toda a fronteira, paredes meias com Espanha. Saí desta cidade em manhã chuvosa sem destino. Percorrendo a cidade da Maia decidi mentalmente o percurso. Rumar a Moledo, percorrer toda a fronteira norte até Miranda do Douro e daí a Vila Real de Santo António. A decisão estava tomada e o elemento essencial (a bicicleta) estava operacional.

    Qual criança traquina, sorri pela semi-loucura pensada e virei à direita. Os quilómetros foram sendo percorridos com naturalidade, passando por Vila Conde, Póvoa, Fão, Esposende, Viana do Castelo, Vila Praia Âncora, Moledo, Caminha e fiquei por Vila Nova de Cerveira. Cheguei a esta no fim de tarde chuvosa, com o sol em despedida. Encontrada a Pousada da Juventude, fiz figas por uma cama. A sorte estava do meu lado. É Peregrino? Em resposta negativa ficou a olhar para mim. Nesta altura é difícil. Deixe-me ver. Tenho aqui uma desistência. Vai ficar é num quarto com mais três peregrinos. Sorri. Sorri. Não faz mal, eu cansado e eles estafados nem nos vamos importar com quem ressonar. O seu rosto iluminou-se e com um gesto amável entregou-me a chave do quarto.

    Depois do banho, desci à vila. Uma forma de conhecer é perdermo-nos. Corremos é o risco de conhecermos o que não interessa e não ver o importante.

    O FORTE DE S. FRANCISCO DE LOVELHE LOCALIZA-SE NA FREGUESIA DE LOVELHE, CONCELHO DE VILA NOVA DE CERVEIRA E REMONTA AO TEMPO DAS GUERRAS DA RESTAURAÇÃO (SÉC. XVII)
    O FORTE DE S. FRANCISCO DE LOVELHE LOCALIZA-SE NA FREGUESIA DE LOVELHE, CONCELHO DE VILA NOVA DE CERVEIRA E REMONTA AO TEMPO DAS GUERRAS DA RESTAURAÇÃO (SÉC. XVII)
    Cerveira é uma vila multicultural, com eventos anuais desde o teatro, cinema, escultura e pintura. Um parque de lazer junto do rio Minho o “Áquamuseu” do mesmo, o castelo e a torre do Relógio. Voltei para a pousada e por não ter tempo para mais visitas perguntei se havia mais para ver dentro da rota que me levaria a Valença. De resposta tive o nome do forte de Lovelhe.

    Dia 4, de manhã, lá percorri um pouco da cidade e retomei a estrada nacional n.º 13, a poucos kms lá estava a rotunda com indicação de Espanha e forte de Lovelhe. Saí da nacional e parei à entrada da ponte internacional e ao seu lado direito, uma guarita. Guarita que se erguia da asfixia da vegetação, mais ao longe uma outra. Diabos, pensei. A muralha terá desmoronado e ninguém se preocupou em a reerguer? Mas não. Estava intacta .

    Que cartão-de-visita. Conhecido também por forte do Azevedo integrava a linha defensiva da margem esquerda do rio Minho, edificado em 1642 e teve um papel importante na defesa do território aquando das invasões Francesas. Ali estava o guarda dos Castelhanos, coberto de ervas e fetos. Não acreditando no que via percorri o caminho até à sua porta, ficando encharcado nos pés pelo terreno alagadiço e pernas pela altura da vegetação. Será assim tão difícil cuidar do património? Bastava umas feirinhas de produtos regionais para o manter digno ou em contrapartida deviam entregar umas espadas e uns escudos aos turistas, fazê-los correr encosta acima e lá chegados ter um tasco para beber um copo e provar uma comida regional. Porquê? Para não ficar abandonado, mato por todo o lado, uma tristeza; assim vai o nosso património.

    Retomei a estrada. Parei novamente na rotunda. Estacionou junto de mim um carro com matrícula Espanhola. O condutor saiu e ficou encostado ao mesmo, surpreendido com o que via. A sua companhia, de máquina fotográfica em riste, qual atirador furtivo, focava e disparava fotos sucessivas murmurando “que verguenza, que verguenza”.

    Sorriu-me, e eu retribuí com um sorriso meio simpático, meio envergonhado, dando mais uma volta à rotunda com a testa encrespada de raiva do que os meus olhos viam e no meu pensamento enclausurado e mudo, gritando dizia:

    Sim, Sim que verguenza!

    Por: Manuel Fernandes

     

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