Fundamentos e Efeitos do Divórcio – Regime Jurídico Atual (Lei nº 61/2008 de 31 de Outubro)
O atual regime jurídico do Divórcio, resultante das alterações ao Código Civil previstas na Lei nº 61/2008, de 31.10, integra relevantes inovações relativamente ao regime anterior, máxime ao ultrapassar e dispensar o requisito de culpa de um dos cônjuges, adotando o conceito de divórcio-falência e abandonando o de divórcio-sanção.
Com efeito, foi excluída a referência à violação culposa dos deveres conjugais como fundamento do divórcio, bastando-se este agora com a efetiva ruptura do casamento, resultante de determinados factos da vida real como a separação de facto por um ano consecutivo.
Como bem interpretou a nossa melhor Jurisprudência “Efetivamente, a Lei nº 61/2008, de 31 de outubro, limitou-se a aprofundar o modelo “moderno” de casamento, por contraposição ao seu modelo “tradicional”, modelo esse que “desvaloriza o lado institucional e faz do sentimento dos cônjuges, ou seja, da sua real ligação afetiva, o verdadeiro fundamento do casamento”, que passa a ser “tendencialmente”, ou, no limite, antes que uma “instituição”, uma simples associação de duas pessoas que buscam, através dela, uma e outra, a sua felicidade e a sua realização pessoal, ideia que justifica e propugna a dissolução jurídica do vínculo matrimonial quando, independentemente de culpa de qualquer dos cônjuges, ele se haja dissolvido de facto, por se haver perdido, definitivamente, e sem esperança de retorno, a possibilidade de vida em comum.” (Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça nº 819/07.7TMPRT.P1.S1, Cons. Relator Hélder Roque).
À luz do regime em vigor, a separação de facto com a definição do artigo 1782º do Código Civil, qual seja a inexistência de comunhão de vida entre os cônjuges, acompanhada do propósito, ainda que apenas da parte de um deles, de a não restabelecer, pelo período de um ano consecutivo, faz presumir que a crise do casamento é definitiva, mesmo que não se demonstre a culpa de um dos cônjuges, a sua violação culposa de um dever conjugal.
Em suma, demonstrando-se que a separação de facto tem a duração mínima de um ano consecutivo o legislador presume iuriset de iure a consumação da rutura definitiva do casamento, dispensando, portanto, a prova de qualquer outro facto.
O desaparecimento do divórcio-sanção determinou, como é óbvio, a alteração do normativo vertido no artigo 1790º do Código Civil, que impedia o “cônjuge declarado único ou principal culpado” de receber na partilha, em caso de divórcio, mais do que receberia se o casamento houvesse sido celebrado sob o regime da comunhão de adquiridos.
Logo, o atual regime impõe o mesmo regime, nos casos de partilha pós-divórcio, para todos os cônjuges, independentemente de culpa ou responsabilidade no divórcio.
Como bem se compreende, o citado regime do artigo 1790º do Código Civil só tem aplicação quando o casamento haja sido celebrado segundo o regime de comunhão geral de bens.
Uma última referência para a alteração do regime previsto no artigo 1791º do Código Civil, no qual também desapareceu a previsão da sanção visando o “cônjuge declarado único ou principal culpado”.
Agora, cada um dos cônjuges perde automaticamente com o divórcio “todos os benefícios recebidos ou que haja de receber do outro cônjuge ou de terceiro, em vista do casamento ou em consideração do estado de casado.”
Nestes benefícios incluem-se, designadamente, as doações para casamento ou entre cônjuges e as doações efetuadas pelos pais de um deles ao filho e cônjuge.
Anteriormente à Lei nº 61/2008, apenas o cônjuge considerado culpado do divórcio perdia estes benefícios, como bem resulta de tudo o exposto.
Por: José Puig*
* Advogado
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