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Edição de 29-02-2024
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    Arquivo: Edição de 31-05-2017

    SECÇÃO: Desporto


    ENTREVISTA COM O TREINADOR DO ERMESINDE 1936, JORGE LOPES

    União do grupo foi a chave de um (novo) êxito rodeado de dificuldades

    No encerramento de mais uma época triunfal para o Ermesinde Sport Clube 1936 - culminada com o título de campeão da Divisão de Honra e a consequente subida à Divisão de Elite - o nosso jornal esteve à conversa com Jorge Lopes, um dos principais protagonistas deste feito. Em discurso direto o treinador ermesindista fez uma análise daquela que nas suas palavras foi a mais difícil das três subidas de escalão alcançadas até à data pelo jovem clube de Sonhos.

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    Voz de Ermesinde (AVE): Olhando para a ainda curta história de vida do Ermesinde 1936 ninguém fica indiferente ao facto de em apenas quatro anos de existência esta ser a terceira subida de divisão alcançada pelo clube - e a todas estas subidas estarem associados títulos de campeão distrital -, motivo de orgulho que poucos emblemas se poderão gabar de ostentar na sua história. Podemos dizer que esta terceira subida foi um objetivo traçado no início de temporada e que agora foi cumprido, ou algo que foi sendo equacionado ao longo da época fruto do vosso trajeto no campeonato?

    Jorge Lopes (JL): A época passada serviu-nos de exemplo para este ano, ou seja, o ano passado fizemos uma temporada tranquila, onde ficámos classificados a meio da tabela, e isso deu-nos "bagagem" para perceber o que tínhamos de fazer este ano para tentar uma nova subida. Acho que o ano passada foi acima de tudo de aprendizagem para toda a gente, até para o próprio clube no sentido de se estruturar de maneira a este ano ter esse objetivo de subir de divisão. É pois verdade que desde o início de época tivemos um discurso em que o objetivo era de facto tentar a subida, embora também sabíamos que era algo muito difícil, pois este é um campeonato muito competitivo, muito duro, e acho que a classificação final espelha isso, já que chegámos à última jornada com seis equipas ainda com hipóteses de subida. Agora, também é verdade que dentro dessa dinâmica de vitória que nós temos quisemos passar a mensagem dentro do grupo de que era importante este ano alcançarmos a subida depois de no ano passado não o termos conseguido, embora, e repita, o objetivo ai passou pela manutenção, algo que foi conseguido, mas é como disse, isso deu-nos argumentos para este ano perceber o que era preciso para almejar a subida, objetivo esse que acabamos por concretizar e ainda por cima com o título de campeão.

    AVE: O que na verdade é mais um feito que fica na história do clube...

    JL: Sim, é um feito, até pelas dificuldades que tivemos ao longo da época. Aliás, acho que em relação aos últimos anos este foi o ano mais difícil de gerir, até pelos problemas que existiram em volta, como a questão (da posse) do estádio, que agora ficou resolvida, mas também ao nível de infraestruturas, e neste caso dou-lhe o exemplo do mau estado do relvado. Posso dizer-lhe que treinámos em condições horríveis durante a época, e lembro-me que muitas equipas que aqui vinham jogar nos diziam que este relvado era muito mau. E essas equipas só cá vinham uma vez durante a época, enquanto nós treinámos e jogámos aqui uma temporada inteira. E isso é muito complicado para uma equipa que quer subir de divisão, que ambiciona conquistar pontos, e principalmente em casa. Mas para ultrapassar todas essas dificuldades tivemos um grupo muito forte e acima de tudo muito unido. Um grupo que percebeu desde início que mais do que tudo tínhamos de nos unir para atingir aquele que era o objetivo principal, a subida de divisão.

    AVE: A base deste novo êxito residiu então na união do grupo...

    JL: Eu penso que acima de tudo foi que desde o início criámos uma identidade muito própria. Este grupo (na sua maioria) veio do ano passado, era composto por um núcleo de jogadores que se identificavam com a forma de estar do clube, com a minha forma de pensar, com a mentalidade ganhadora que temos. Mas acho que a chave do êxito foi mesmo isso, foi sentir que dentro das dificuldades que tínhamos queríamos muito atingir o nosso objetivo. Até porque convém ainda referir que lutámos com clubes melhor estruturados do que nós, clubes que, por exemplo, treinavam quatro vezes por semana enquanto nós só treinávamos três, e um dia a mais de treino por semana faz uma diferença enorme. Mas nós unimo-nos contra todas essas dificuldades. Lembro-me, por exemplo, que a meio do campeonato tivemos uma vantagem de seis ou sete pontos para o segundo classificado, e então criou-se a expectativa nas pessoas de que as coisas eram fáceis, mas... não foi assim, até porque sabíamos que iríamos ter uma fase má, e acabamos por vir a tê-la, e nestes três últimos meses em que as coisas se equilibraram (em termos de campeonato) foi quando nós precisamos de mais união. Recordo que nessa altura tivemos uma conversa muito importante dentro do balneário, e foi essa vontade e essa união que nos deu força para chegar ao fim e conseguir os objetivos. Este grupo tem uma personalidade muito forte, e se não foi o melhor grupo que tivemos nestes quatro anos foi sem dúvida um dos melhores.

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    AVE: Analisando agora o vosso percurso ao longo do campeonato, é possível verificar que depois de uma primeira volta de grande nível a equipa caiu um pouco na segunda metade da prova, a julgar por alguns resultados negativos inesperados obtidos ante equipas do fundo da tabela, caso do Ataense, que veio a Sonhos ganhar. Ainda no plano das estatísticas vemos que cinco das sete derrotas que o Ermesinde 1936 averbou ao longo da competição ocorreram precisamente nesta segunda volta. O que se passou para justificar esta quebra ao nível de resultados?

    JL: É verdade, mas temos agora de ver isso numa perspetiva mais global, e perceber que este é um campeonato com 30 jornadas. E se é verdade que fizemos uma primeira volta excelente, podemos também olhar para o caso do Infesta, que fez uma segunda volta excecional mas que na primeira volta perdeu muitos pontos. Nós acabamos por perder pontos onde não contávamos, caso do Ataense, como disse, com quem perdemos os dois jogos disputados. Agora, também é verdade que tivemos vitórias muito importantes em sítios onde se calhar muita gente pensava que não íamos ganhar, casos das vitórias nos terrenos do Infesta, dos Dragões Sandinenses, etc. Mas é normal haver fases menos boas ao longo da época, são coisas que acontecem, ou porque há jogadores que saem, ou porque basta haver dentro do plantel duas ou três lesões em posições importantes para alterar tudo, e nós passámos por tudo isso. Perdemos alguns jogadores importantes, caso do Gustavo, um ala brasileiro com muita qualidade que estava no primeiro ano de sénior, mas que a dada altura se deparou com um problema pessoal, em que tinha de resolver a situação do visto de residência, e o Ermesinde 1936 não tinha capacidade para o inscrever como atleta profissional no sentido de resolver essa questão, pelo que ele acabou por ir jogar para os Açores, já que essa era a única hipótese de arranjar um contrato profissional. Tivemos também situações em que um ou outro jogador teve de sair por motivos de ordem profissional, e uma vez que nós não somos profissionais (do futebol) tivemos de colmatar essas situações. É verdade também que nos reforçamos, mas reforçamo-nos com jogadores que sabíamos que não iam render a curto prazo, caso do Fábio Alves, um ponta de lança com muita qualidade, mas que sabíamos que vinha de uma paragem de dois anos, e compreendíamos que a ajuda dele viria mais no prazo de dois ou três meses, o que, aliás, acabou por acontecer na reta final da época. Tivemos de facto a nossa fase mais crítica em janeiro e fevereiro, mas com mérito conseguimos ultrapassa-la e mantivemo-nos sempre no primeiro lugar, que era o mais importante.

    AVE: Alguma vez sentiram que nessa fase menos boa da época a liderança poderia ser perdida e que o objetivo da época ficaria assim mais difícil de alcançar?

    JL: Se calhar até mais pela qualidade do Infesta, que a partir de certa altura foi o nosso adversário mais difícil, e não tenho dúvida de que se eles tivessem sido campeões o título não teria sido mal entregue, desde logo porque os considero uma excelente equipa, muito bem organizada, que joga junta há três ou quatro anos, e este teria obrigatoriamente de ser o ano deles. Por isso, pela caminhada que eles estavam a fazer sabíamos que ia ser difícil (aguentar o primeiro lugar), mas apesar de termos perdido pontos onde não contávamos conseguimos ter sempre uma boa margem pontual (face à equipa matosinhense) para gerir e acabámos por não ser ultrapassados. Agora, é verdade que a determinada altura tivemos a tal margem de sete pontos que nos deu algum conforto ilusório, que eu sabia que era ilusório, fruto da capacidade das outras equipas e do equilíbrio que há neste campeonato, e nós tivemos essa capacidade de aguentar até ao fim o primeiro lugar…

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    AVE:… Pelas suas palavras podemos encarar esta talvez como a mais difícil das três subidas de divisão alcançadas pelo Ermesinde 1936 nestes quatro anos…

    JL: … Sem dúvida que foi, até por este ser um campeonato muito competitivo, não tanto pela qualidade das equipas, mas pela forma como jogam. É um campeonato muito cínico, em que a maior parte das equipas joga no erro do adversário. É um jogo de paciência, principalmente para quem anda lá em cima (na classificação) e quer ganhar, e que enfrenta sempre muitas dificuldades, pois joga com equipas que se organizam a partir de trás e que abdicam de ter jogo, equipas que dão a iniciativa ao adversário e jogam muito no erro, como disse, e nós perdemos muitos pontos também em função disso.

    AVE: Voltando atrás nesta conversa para pegar num fator extra quatro linhas que a determinada altura da temporada andou, mais uma vez, nas bocas do Mundo, e que se prendeu com a situação do Estádio de Sonhos. Primeiro foi o então proprietário do recinto a ameaçar o clube de despejo, ao que se seguiu muita discussão pública, a intervenção da Câmara, o processo de expropriação e por fim a municipalização. Como é que o grupo viveu toda esta situação?

    JL: Ao princípio foi muito difícil. Antes de tudo ficar resolvido nós vivemos muito a situação, pois trabalhávamos aqui e tínhamos conhecimento do que se passava, embora a Direção do clube estivesse muito mais a par de todos os pormenores da situação, mas nós tínhamos consciência de tudo o que se dizia à volta. Vivemos com a ameaça de não treinar aqui, da incerteza do local onde iríamos treinar, mas isso tudo aconteceu na nossa melhor fase da época em termos desportivos, estávamos bem classificados, e por isso conseguimos passar um bocadinho à margem da questão, o que se calhar acabou por ser uma benesse, porque se essa situação tivesse acontecido na nossa pior fase iria agudizar mais o problema. Mas há o reverso da medalha, ou seja, a situação resolveu-se e nós não tirámos nenhum dividendo prático, tudo continuou igual, continuámos com os mesmos problemas ao nível do relvado e já o estádio era municipal. Claro que agora há muita expectativa em relação ao próximo ano com a colocação do relvado sintético, algo que para o clube vai ser muito bom. Aliás, penso que para o ano e com este novo relvado, o Ermesinde 1936 tem uma oportunidade de crescer ainda mais e de se reestruturar, porque acho que nestes quatro anos de existência o clube viveu um bocadinho ao colo do que passou dentro das quatro linhas, ou seja, o sucesso desportivo é que foi empurrando o clube para a frente. Desportivamente o Ermesinde 1936 cresceu muito, porque acabou por dar saltos nestas divisões todas, mas em termos estruturais cresceu pouco, e na próxima época o clube tem um desafio enorme ao competir na Divisão de Elite.

    AVE: Quando fala em crescimento e reestruturação fala em quê concretamente?

    JL: Como eu disse o clube acaba por dar passos importantes com estas subidas de divisão, mas falo no caso concreto deste ano, com a subida à Divisão de Elite, que é um patamar que não tem nada a ver com aqueles em que estivemos até agora. Com este degrau que subiu o Ermesinde 1936 deu um salto enorme, e as pessoas têm de estar preparadas para o que ai vem, têm de ganhar outro tipo de apoios, porque senão o clube vai passar mal na Divisão de Elite. Estamos a falar de um escalão que no fundo era a antiga 3ª Divisão Nacional, um escalão diferente de tudo o que encontrámos até aqui, quer o tipo de futebol que se pratica quer ao nível de clubes que lá jogam, clubes que têm alguma dimensão e orçamentos muito superiores ao do Ermesinde 1936, orçamentos que eu sei que o Ermesinde 1936 não vai conseguir ter, e não o podendo ter temos de cativar os jogadores de outra maneira, dando-lhes, por exemplo, condições de trabalho. Temos de parar um bocadinho de ser ambiciosos dentro do campo e ser mais ambiciosos fora dele, de criar as tais estruturas físicas no sentido de fazer o clube crescer.

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    AVE: Em relação à próxima época, o Jorge Lopes vai continuar a liderar o Ermesinde 1936 na Divisão de Elite?

    JL: Nós ainda não falamos, vamos fazê-lo nos próximos dias. Mas é público que eu tenho um grande carinho por este projeto, até porque estou aqui desde o "momento zero", e o meu crescimento como treinador está interligado com o crescimento do clube. Além de que sou adepto do clube há já muito tempo. Agora, eu estou na fase de esperar para ver o que é que o clube quer, o que a Direção vai dizer, qual é o objetivo para o próximo ano, para depois decidir o que fazer.

    AVE: Mas quer ficar?

    JL: Eu sempre disse que o meu percurso é transversal ao do Ermesinde 1936. Acho que as coisas têm evoluído naturalmente, e quando olho para trás vejo que estava a treinar na 2ª Divisão Distrital e agora sujeito-me a treinar na Divisão de Elite, o que quer dizer que eu também venho subindo alguns degraus. Claro que sou ambicioso e é lógico que os projetos vão aparecendo, e este sucesso todo também vai-me abrindo algumas portas, mas tenho dado prioridade ao Ermesinde 1936, porque gosto de estar aqui, sinto-me apoiado pelas pessoas, pela massa associativa, pela claque, sinto esse carinho, esse retorno do que nós damos em campo, e portanto enquanto eu me sentir confortável e achar que posso acrescentar alguma coisa vou dar sempre a prioridade a este clube. Mas é como disse, vamos reunir com a Direção, pôr tudo em cima da mesa, e ver o projeto que querem para a próxima época.

    AVE: Falou no apoio da massa associativa e da claque em particular, que mais uma vez foi o 12º jogador do Ermesinde 1936...

    JL: Sem dúvida, desde o início. Lembro-me da altura em que tivemos a tal fase má da época, e essa foi a fase em que eles mais nos apoiaram. Foi incrível. Foram de um apoio extremo, sempre estiveram do nosso lado, sempre nos apoiaram. E foram importantíssimos não só neste ano mas também desde o início do clube. Quem joga no Ermesinde 1936 gosta de jogar aqui, sente-se acarinhado, mesmo com todos os problemas que existem. Acho que este é um clube diferente, isso é inegável, e por isso toda a gente gosta de aqui estar.

    Nota: Antes do fecho da presente edição contactámos o presidente da Direção do Ermesinde 1936, Jorge Costa, no sentido de conhecer o resultado da reunião entre este órgão e Jorge Lopes com vista à continuidade do treinador à frente do clube na próxima temporada. Jorge Costa confirmou que o convite por parte da Direção ao técnico para que este prolongue a sua ligação ao clube foi feito e que tudo se encaminha para que Jorge Lopes continue assim a liderar os destinos do clube, desta feita na Divisão de Elite.

    Por: Miguel Barros

     

     

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