Subscrever RSS Subscrever RSS
Edição de 31-03-2024
  • Edição Actual
  • Jornal Online

    Arquivo: Edição de 31-10-2013

    SECÇÃO: Crónicas


    foto

    Eu acredito…

    Esta reflexão é escrita em dia de eleições. Não sei quem politicamente vai ganhar ou perder mas o que sei é que votar, infelizmente começa a ser um dos raros benefícios da nossa democracia, porque podemos fazê-lo de forma verdadeiramente livre e aqui não conta o que diremos posteriormente quando tentarmos entrar no “jogo das influências” ou ainda colocar-nos do lado de quem ganhou – «Por acaso votei em si!». Confesso que estou ansiosa passe rapidamente esta “onda” pois parece que andamos sempre a olhar uns para os outros e uma simples conversa informal com alguém “do inimigo” (independentemente da cor política que representa), faz com que sejamos olhados de soslaio. Se calhar serei eu que encaro as coisas de forma errada, mas o que é certo é que a vida me tem cruzado com gente conhecida e amiga que defende ideias diferentes entre si e nada tem de errado como excelentes seres humanos que são.

    Eu acredito que se tivesse selecionado amigos e conhecidos unicamente pelo simples facto de que me iriam servir alguns interesses ou ainda porque somente alinhavam pelo meu pensamento e opinião (não se atrevendo a contestar e sugerir mudanças), a vida não teria a graça que tem. A ser assim, eu também não teria usado como “alavanca” de motivação para este domingo escolher um evento a que tinha assistido dois dias antes e em que a vida me voltava a fazer cruzar com duas pessoas que não sendo mitos, existem num querer muito forte: o João e o Ricardo. Cumpriam a promessa de continuar a fazer obra num Portugal cá dentro e numa internacionalização em que fazem questão de trazer gente de valor, que nos adicionam conhecimentos na partilha em que é usada a visão sistémica. Foi o que vi acontecer com a espanhola Maria Sabater e o italiano Fabrizio Cantarini, que a uma dada altura me diziam que aqui, em Portugal, se sentiam “em casa”.

    Não me surpreendia muito ver que aqueles dois amigos conseguiam, de novo, pontuar alto nos objetivos a que se propuseram. Mas o que verdadeiramente me levou àquele evento, foi confirmar “in loco” uma outra coisa em que eu acredito fortemente e vi ser possível: ceder lugar à partilha, num pequeno espaço onde é possível caber a solidariedade. Eles fizeram-no e num evento que se prendia com um seminário de formação, dedicaram um pedacinho de si a uma causa que é de todos – a luta contra o cancro infantil. Certo é que com a contribuição de 5 euros, que revertia integralmente para a Acreditar – Associação de Pais e Amigos das Crianças com Cancro, recebíamos um kit para participar dos dois eventos que a empresa criada por estes dois jovens apadrinhou. Contribuindo, eu optei mesmo por ficar a assistir e registar toda a aprendizagem que dali poderia retirar.

    Um dos eventos era uma aula de zumba. O professor sobre quem recaiu a escolha para estar ali não poderia ser melhor porque, num ritmo que eu diria “elétrico” aquele jovem conduzia uma sala de dança com dezenas de pessoas que eram convidadas a segui-lo ao som de ritmos de música latina, com uma liberdade corporal que levava a que em 50 minutos de frenesim fosse possível que perdessem entre 400 a 900 calorias. Pelo que me foi dado presenciar eu acredito que naquela sala não deixaram somente as calorias mas também alguns dos “pesos” que sobrecarregariam quem passou a soleira daquela porta: frustrações, mágoas, deceções e preocupações (daquelas que muitas vezes estará somente na mão do destino resolver), tudo num fantástico “feel music…and dance”, que continuou, numa piscina onde mergulharam de seguida para continuar a fazer hidroginástica ao som da música.

    Foto GL
    Foto GL
    Nestas andanças, passávamos por uma banquinha com duas pessoas identificadas com t-shirts onde se podia ler “Acreditar”. Eu acreditei naquilo que a Rosa Lage e a Isabel Maio me explicaram, no papel de voluntárias desta associação, que marca a sua presença no IPO - na área de consultas externas, no Isolamento e no Serviço de Transplante e Medula Óssea. No Hospital de S. João - no projecto “Joãozinho” e na área das consultas. Também a “Acreditar” sente necessidade de se adaptar a novas necessidades e abraça novos projetos: o “Aprender a Ler”- acompanha os meninos que vão para casa e impossibilitados de frequentar a escola podem contar com uma professora voluntária que se desloca a sua casa para lhes dar apoio na aprendizagem e o projeto “Arco-Íris”- acompanhamento nos cuidados paliativos. Sobrevivem da ajuda dos “mecenas”, do voluntariado e referem o que Nunca fazem: pedir porta a porta ou ainda pedir dinheiro por telefone.

    Li diversas vezes que o ser humano será sempre um “animal político” mas nem toda a gente tem vocação para a política. A vida tem-me mostrado que cada área de interesses tem as suas regras próprias, o seu “código de conduta” e o seu “código do silêncio”. Mexer estraga e percebe-se que “a viola quer-se na mão do tocador”. Todos compreendíamos Ivone Silva quando num sketch humorístico dizia: «Com um vestido preto eu nunca me comprometo», atitude possível para os “malabaristas” ou para os que não se sentem confortáveis na área da política, mas impensável que seja adotada por parte de um político, que tem mesmo que se comprometer - com as suas promessas e com as pessoas a quem pede um voto de confiança. Por isso fui aprendendo a respeitar a profissão do político, ainda mais que em caso de eleições irá a “julgamento” feito por um escrutínio livre e democrático. Das suas decisões certas, dúbias ou erradas vai depender não só o seu futuro como também o número de pessoas que a sua “derrota” conduzirá a um “expurgo” (cíclico) e do qual não os poderão proteger ou poupar, ainda mais que isso é uma prática que o tempo e a experiência transformou em “hereditária”.

    De tudo o que nos poderá reservar o futuro, eu decidi mesmo continuar a acreditar que as pessoas (que não escolhem o caminho político), sempre terão lugar em equipas de trabalho onde serão úteis pelo seu saber, sentadas lado a lado com pessoas de saberes diferentes com contribuições positivas a nível de soluções que, mesmo ínfimas, sempre trarão algo de benéfico com o seu “ruído” de desassossego. Ao olhar para a pequena banca da “Acreditar”, onde tudo tinha o rosto de meninos felizes, tal como víamos estampado na t-shirt da Rosa e da Isabel (orgulhosas, diziam que o feliz criativo tinha vindo pelas mãos da artista plástica que com eles colabora, Carla Antunes) eu percebi que não posso mesmo passar para o grupo dos que “já não acredita” porque isso seria como estar “morto vivo”. Depois de um pequeno convívio com que se encerrou este evento, para aquele dia de sexta-feira, olhando para todo aquele grupo de gente jovem eu acreditei que o João e o Ricardo vão sempre continuar a perseguir os seus sonhos numa amizade que os irá continuar a unir.

    Gostei de perceber que em “Mitos e Verdades” eu acreditei, e bem, mesmo na parte em que me referia ao apoio incondicional e imprescindível de uma família que lá continua, “de pedra e cal”. Contudo, não menos precioso é o “back-office” (pilares em que assenta a estrutura profissional destes jovens) e aqui falo da Virgínia, a menina já grande e madura que se emociona tão somente por escutar o “descompasso das batidas do coração da vida”. Penso que isso se deve ao facto de que, quando foi voluntária, a Vírginia terá trazido junto com esse seu coração (repleto de experiências vivenciadas que nunca esquecerá), uma capacidade invulgar nos tempos de hoje …não ter a memória curta, ao não ter deixado para trás causas que são de todos nós. E agilizou para que tudo coubesse numa simbiose e harmonia perfeita que nos terá deixado uma sensação grata de utilidade social quando saímos por aquela porta – mais “ricos” como seres humanos. Por tudo o que presenciei compete-me retorquir ao agradecimento que recebi por ter participado: obrigado, digo eu – pelo privilégio de me ajudarem a perceber que eu ainda acredito em tanta coisa.

    Por: Glória Leitão

     

     

    este espaço pode ser seu Este espaço pode ser seu Este espaço pode ser seu
    © 2005 A Voz de Ermesinde - Produzido por ardina.com, um produto da Dom Digital.
    Comentários sobre o site: [email protected].