Serras de Pias e Castiçal agredidas
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Foto ARQUIVO |
No sul dos Concelhos de Paredes e Penafiel, paredes-meias com o concelho de Valongo (serras de Pias e Castiçal) existe uma extensa área em que a natureza se encontra relativamente preservada, com pouca pressão humana, onde subsiste alguma agricultura dispersa por uma grande mancha florestal. Para além de muita floresta industrial de pinheiros e eucaliptos, subsistem bosques de vegetação autóctone onde para além de Carvalho alvarinho (Quercus robur), Carvalho negral (Q. pyrenaica), Sobreiro (Q. suber), Castanheiro (Castanea sativa) e Medronheiro (Arbutus unedo), se encontram algumas espécies mais raras como o Folhado (Viburnum tinus), o Azereiro (Prunus lusitanica), o Loureiro (Laurus nobilis), o Loureiro-cerejo (Prunus laurocerasus), o Azevinho (Ilex aquifolium), o Freixo (Fraxinus excelsior) e a Pereira--brava (Pyrus bourgaeana).
Esta área é atravessada por inúmeros cursos de água como os rios Sousa, Ferreira e Mau e seus tributários como o ribeiro de Lagares, o ribeiro das Banjas, etc.. É precisamente nas margens e lameiros destes cursos de água que se pode encontrar uma grande biodiversidade e bosques ripícolas bem conservados. Nestas zonas existem espécies com um alto estatuto de conservação, sobretudo anfíbios e répteis, destacando-se endemismos como a rã ibérica (Rana iberica) e a salamandra lusitânica (Chioglossa lusitanica) para citar apenas alguns exemplos que, no Concelho de Valongo, contribuíram decisivamente para que algumas áreas integrassem a Rede Natura.Também com estatuto de protecção existem na área os urzais-tojais (povoamentos de Erica umbellata, Pterospartum cantabricum, Ulex micranthus, Ulex minor etc.), onde se abriga o pinheiro-baboso, Drosophyllum lusitanicum, espécie insectívora em vias de extinção e por isso protegida.
Os urzais higrófilos constituídos por Lameirinha Erica ciliares, Tojo-molar Ulex minor, Arranha-lobos Genista berberidea, Cardo Cirsium filipendium, Urze Caluna vulgaris, Tormentilha Potentilla erecta, etc, são considerados habitats prioritários para conservação pela directiva comunitária Habitats e, portanto, cortar ou destruir esses matos é uma actividade potencialmente nociva e ilegal. Neste espaço os produtores florestais organizaram-se para preservar a floresta criando uma das primeiras e mais extensas Zonas de Intervenção Florestal (ZIF) onde se pretende desenvolver boas práticas florestais, proteger a floresta dos fogos e desenvolver uma actividade silvícola sustentável e respeitadora dos valores naturais.Pois foi precisamente nesta zona que se desenrolou nos dias 24 e 25 de Outubro, um raide todo-terreno denominado Raid TT Porto-Marco, que foi organizado completamente à revelia dos proprietários e da entidade gestora da ZIF e que, sem mostrar o menor respeito pelos proprietários e pelos valores naturais, apareceu, já organizado e patrocinado, propondo-se atravessar e espezinhar estas zonas com centenas de veículos motorizados, não falando já dos espectadores da prova.
A organização, a cargo do Moto Clube do Marco ignorou os direitos dos proprietários (a prova realiza-se quase inteiramente em caminhos privados) e colocou placas a proibir o trânsito em acessos particulares, privando assim os proprietários do livre acesso aos seus terrenos durante dois dias, o que constituiu um atropelo às liberdades e garantias dos cidadãos.
Por: Jaime Prata
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