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    Arquivo: Edição de 15-02-2008

    SECÇÃO: Arte Nona


    “A Marca do Pecado”

    A importância das revistas na divulgação da Banda Desenhada não tem hoje a pujança que já teve e que pode comprovar-se contabilizando a infinidade de títulos que aí surgiram em pré-publicação antes dos álbuns.

    Na BD franco-belga revistas como a extinta “À Suivre” tiveram, a esse título, um papel crucial.

    O surgimento e disseminação dos jogos electrónicos e do vídeo veio dar uma machadada nesse mercado, tendo algumas das publicações, para sobreviver, de optar por um mercado mais ou menos paralelo ou de nicho. É o caso da “Heavy Metal”, especializada na ficção científica e na heroic phantasy, ou da “L’Echo des Savanes”, título que aqui nos traz hoje, e cujo objecto é mais o humor satírico e o erotismo, deixando um número razoável de páginas dedicadas a outros assuntos não relacionados com a Banda Desenhada.

    A “L’Echo des Savanes” não deixou, contudo, de parte, a BD, e é precisamente uma pré-publicação nas suas páginas que nos ocupa hoje – “La Marque du Peché” (“A Marca do Pecado”), título que tem por autores os argentinos Carlos Trillo – um dos mais prolíferos argumentistas de Banda Desenhada de que há memória –, e Horacio Domingues.

    A estória tem por cenário a Argentina de 1840, onde com o apoio dos grandes latifundiários e do Império Britânico, o povo argentino sofria a cruel ditadura do general Rosas.

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    Sendo uma história (ou estória se se preferir), que tem por pano de fundo a luta contra ditadura odiosa do general Rosas na Argentina de um certo período do século XIX, “A Marca do Pecado” é, também – não ousamos dizer sobretudo, uma estória de amor.

    Nela se cruzam, a partir do grande talento criativo de Carlos Trillo, personagens de múltiplos matizes, que fogem muito a uma estereotipada e maniqueísta tipificação de bom e mau. Aparecem-nos aqui quer os esbirros torturadores ao serviço dos poderosos, cães de guarda sanguinários que se comprazem no uso da violência, quer os serviçais mestiços ou de origem índia, que mais ou menos secretamente aspiram a um mundo mais justo, quer os aparentemente incapazes de fazer mal a uma mosca, mas que, nos bastidores, vão urdindo uma teia capaz de os fazer levar a água ao seu moinho.

    Mas, como dissemos, nem tudo é luta política. Cruzando-se com esta há a estória de amor entre Angustias, a irmã do latifundiário – que marca com um ferro as mulheres que possui e, estranhamente, Angustias está marcada – e Thomas, ferido quase de morte num confronto armado que o opôs aos apoiantes do general Rosas, e que guarda com ele uma mensagem que é necessário entregar.

    Quando, a esvair-se em sangue, Thomas está prestes a sucumbir, encontra Angustias, que pretende suicidar-se (ou deixar-se morrer) após mais um dos seus noivos partir para o além na hora em que ela se prestava a contrair o matrimónio com ele. Como se fosse uma maldição.

    Desta última vez foi ainda pior, é que, abatido a tiro por um atirador furtivo, o noivo de Angustias morreu, já depois de contraído (embora nunca consumado) o matrimónio. Ela fica assim, viúva.

    Do ponto de vista gráfico, há a destacar, no trabalho de Horacio Domingues, um excelente sentido dos enquadramentos, sucedendo-se planos diversos adequadamente, quer nas cenas das trocas de tiro, quer na contextualização dos ambientes domésticos, quer na definição das personagens.

    Entre as personagens mais ou menos secundárias, destaque para a criada negra de Angustias, que a protege em todas as circunstâncias, ainda para a bela índia Ayelen, amante dos poderosos, mas que conspira na sombra contra eles, e que foi a mestra de Angustias – longe de ser uma ingénua – nas artes do amor, o bobo, de que todos abusam e a quem todos desprezam, mas cuja boca profere, com a sabedoria dos loucos as palavras da verdade que mais ningém ousa proferir, o tenebroso Leandro, irmão de Angustias, homem poderoso e vicioso e, por fim, a soturna personagem de Scarpa, uma espécie de intelectual, aparentemente seboso, cobarde e manejável, mas que, na sombra, é responsável pelas mortes de alguns dos pretendentes de Angustias, porque pretende tomar o seu lugar.

    A todos Domingues vai marcando numa caracterização perfeita e adequada.

    As cores são sempre aguareladas e pardas, correndo dos azuis aos bordeaux, com algumas vinhetas de maior dimensão mostrando planos de conjunto.

    Se do talento de Carlos Trillo não dizemos novidade nenhuma, há que sublinhar então o trabalho de Domingues, nesta reconstituição romanesca da Argentina sangrenta dos tempos do general Rosas, desses meados do século XIX.

    Por: LC

     

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