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    Arquivo: Edição de 15-06-2007

    SECÇÃO: Destaque


    NOTÍCIAS DO CENTRO SOCIAL DE ERMESINDE

    Esta moçoila ainda só fez 100 anos

    Tomara, ai tomara qualquer um de nós chegar assim aos 100 anos!, frescos como uma alface e finos como um alho como a D. Laura faz questão de nos mostrar. Ela que sendo a decana do Lar de S. Lourenço, deixa muitas para trás, talvez em resultado das injecções de sais de ouro que, devido a um princípio de tuberculose, teve em nova que levar –, comenta ela, divertida com essa possibilidade.

    O Lar fez-lhe uma grande festa no passado dia 3 de Junho.

    Foto MANUEL VALDREZ
    Foto MANUEL VALDREZ
    Natural de Mesão Frio, Alto Douro, a Laurinha – como também carinhosamente lhe chamam, nasceu no seio de uma família que, com ela, trouxe ao mundo nada menos do que nove filhos.

    O pai era serralheiro e a mãe cozinhava pão para fora e tinha uma padaria.

    Mas muito cedo veio viver para casa de um tio, mais abastado, que vivia no Porto, e tudo por causa dos dentes que teve de tratar, no Porto – «vieram-me duas camadas de dentes, como a pescada», conta ela.

    E explica como foi bem acolhida em casa do tio, que era armazenista.

    Primeiro marçano, depois caixeiro, e assim sucessivamente, o tio tinha chegado à posição que tinha ao fim de muitos anos, mas vivia muito bem agora.

    A Laurinha ajudava na casa, embora lá houvesse criadas e ela fosse a menina Laurinha.

    A tia ensinou-lhe tudo. «Quando tiveres uma criada tens que saber mandar», era o que ela lhe dizia.

    Conheceu o marido, o José Capela, um belo homem (curiosamente mais novo do que ela uns 13 anos) – em Pedras Rubras, ele também ligado ao mundo do comércio, pois era chefe de armazém numa grande loja de fazendas em Fernandes Tomás.

    A sogra gostava muito dela, e antes de ela e o marido se aproximarem, até costumava dizer para o filho, ainda se lembra a Laurinha: «Andas para aí com umas e com outras, e tens aqui a Laurinha, que é tão boa rapariga». Ela também gostava muito da sogra.

    VEIO VIVER

    PARA ERMESINDE

    Foto URSULA ZANGGER
    Foto URSULA ZANGGER
    Ficaram a viver em Ermesinde. «Ele era muito dado», recorda a D. Laura com saudades. Nunca tiveram filhos, e chegaram até, em certa altura, a pensar adoptar uma criança.

    Mas depois afeiçoaram--se muito ao filho de uns vizinhos a quem ajudaram a criar e a amar como se fosse mesmo filho deles.

    A Laurinha até conta que um dia, à noite, estava ele transido de frio e que, estando eles já na cama, lhe disseram para se ir aquecer para o pé deles. E nessa altura o miúdo tinha já 14 anos.

    Se tratado foi como um filho, também hoje trata a Laurinha como se fosse mãe, foi ele que tratou de tudo para a trazer para o Lar, é ele quem a acompanha em tudo o que é preciso.

    A Laurinha passava assim os seus dias a tratar da casa e ainda a ajudar a cuidar do menino.

    O seu marido morreu há cerca de seis anos.

    Em Ermesinde, chegaram a viver na Travagem, relativamente perto – vá lá – do lar onde hoje ela passa os seus dias. Mas a água não era boa, deixava-lhe a roupa em fraco estado.

    Depois teve casa na Gandra, próximo da Casa do Povo, onde esteve aí uns bons 23 anos.

    Hoje considera-se feliz por estar num lar assim.

    «São todas muito minhas amigas», diz ela, «trazem tudo quanto quero», diz ela exagerando até os desvelos com que é tratada. «E limpeza? Não podia ser mais!».

    E confidencia sobre a maneira pouco cuidada como chegaram ao Lar outras utentes vindas daqui e dali e como agora se apresentam muito bem.

    E referindo-se à directora do Lar de S. Lourenço, Anabela Sousa, comenta ainda com sincera e genuína simpatia: «a Dra. é muito boa pessoa!».

    No Lar partilha o quarto com uma companheira. «Ela fala pouco», refere.

    E conta como trata do quarto e vai fazendo a sua vida, como pode.

    Foto URSULA ZANGGER
    Foto URSULA ZANGGER
    Porque ela também não é de ferro. Agora vê muito mal, já não consegue ler ou ver televisão.

    «Nem sei se o senhor tem bigode ou não», diz-me ela, talvez vislumbrando uma pequena sombra, ou recordando alturas anteriores em que o jornal foi lá e falou das festas do Lar ou outras do Centro Social.

    E ainda outra coisa, que por vezes a apoquenta e lhe faz sentir os rins e a impede de andar sem dificuldade, tornando necessário que a vão buscar e trazer ao seu quarto, caso ela queira descer ao refeitório.

    Mas, tirando isso, quem é que adivinha a sua idade, lúcida como está, e cheia de simpatia, onde não se adivinha uma ponta de azedume?

    Conta-nos que talvez seja das injecções de sais de ouro que o Dr. Costa Maia lhe receitou quando, com 17 anos, ficou doente com um princípio de tuberculose.

    Assim com o ouro no corpo não havia mal que lhe chegasse.

    A FESTA

    DE ANIVERSÁRIO

    No passado dia 3 de Junho, por sua causa, o Centro Social esteve em festa. Não é todos os dias que alguém faz 100 anos.

    Houve missa, houve sessão de música, a presença de muita gente, de todas as idades, para lhe cantar os parabéns, muitas muitas flores, um belo bolo de aniversário onde se podia ler “100 Anos” (para não falar dos outros), muitas prendas, com um quadro com a fotografia dela e versos que lhe dedicaram, que ela agora tem no quarto.

    A Laurinha recebeu muitos beijos e abraços, que retribuíu sorridente, admirando todos com a aparência dos seus setenta anos (ou nem tanto), o cabelo ainda quase preto, o movimento das mãos muito ágil, o olhar, mesmo que já um pouco nublado, ainda muito perspicaz, como pudemos constatar quando nos reconheceu de longe, no dia da festa dos seus anos.

    Dá que pensar. Será que foi mesmo obra da injecção de sais de ouro?!

    Por: LC

     

     

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