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    Arquivo: Edição de 15-04-2007

    SECÇÃO: Arte Nona


    Vinheta DAVID MAZZUCCHELLI/PAUL KARASIC
    Vinheta DAVID MAZZUCCHELLI/PAUL KARASIC

    "Tudo começou graças a um número errado"

    Abordamos hoje uma obra incontornável na Banda Desenhada contemporânea, em boa altura editada também em Portugal, pela Asa, no formato graphic novel.

    Formato, aliás que justifica, em parte, o pretexto para que um autor consagrado da Banda Desenhada ao mais alto nível - Art Spiegelman (o autor de “Maus” [“Ratos”]) sobre ela se debruce na introdução. Mas, como veremos, essa será uma pequena parte da justificação do seu texto.

    Tal como o seu “Maus”, que deu direito a um Prémio Pulitzer, também “Cidade de Vidro” – é esta a obra de que agora falamos – permitiu uma aproximação, sempre bem-vinda entre a 9ª Arte e a grande Literatura. No caso, por uma razão imediata, é que esta obra parte da adaptação do livro homónimo do consagrado escritor norte-americano Paul Auster à Banda Desenhada.

    Os autores, da adaptação e do grafismo são o já consagrado David Mazzucchelli e Paul Karasik, mas a obra, em BD, deverá ser considerada a quatro mãos, Auster e Spiegelman, que iniciaram a discussão sobre o projecto, Mazzucchelli, e finalmente, Karasik, que acabaria finalmente por o viabilizar.

    A crítica “Comics Journal” acabaria por consagrar a obra como «um dos 100 melhores comics do século».

    O projecto de “Cidade de Vidro” em BD não foi pêra doce, a julgar pelas dificuldades várias que Spiegelman aponta na introdução do livro. Depois da instigação de Bob Callahan, um amigo do consagrado editor, professor e autor, para adaptar a BD romances negros urbanos, conta Spiegelman que, ao reler “Cidade de Vidro” de Paul Auster, viu logo ali as potencialidades, mas também os desafios que se colocavam. Ao contactar o escritor – seu amigo –, este, aliás avisou-o de que as várias tentativas de adaptar esta sua obra ao cinema tinham falhado rotundamente.

    Spiegelmann lembrou-se então de convidar David Mazzuchelli, outro quadrinista norte-americano, que se tinha notabilizado por reinventar as figuras dos super-heróis, para dar vida ao projecto. Mazzucchelli aceitou. mas, conta ainda Spiegelman, «(...) após algumas tentativas, David começou a desanimar: conseguia contra a “história” do romance de Paul, mas não era capaz de “agarrar” os ritmos internos e os verdadeiros mistérios que faziam com que valesse a pena contar a história. Talvez fosse impossível.

    Em desespero de causa, contactei Paul Karasic (...)».

    Karasic tinha sido aluno de Spiegelman na New York’s School of Visual Arts. E também, professor de Arte, tendo por coincidência entre os seus alunos um filho de Paul Auster, o que o fez interessar-se mais pela obra deste e ter até começado a fazer uns esboços de “Cidade de Vidro”. Spiegelman bateu a boa porta.

    O relato do editor é muito interessante pelo que revela sobre a verdadeira essência da obra de arte na Banda Desenhada.

    CIDADE DE VIDRO

    O livro, com pranchas a preto e branco puro, excepto as três finais, com a admissão do cinzento, é pois uma obra que vale não só pelo grafismo exemplarmente posto ao serviço de uma narrativa, mas também pelo ritmo que vai sendo imposto, ora diligente ora arrastado, como no final, sinal da degradação do protagonista, o detective privado Quinn.

    A história, de enredo muito complicado tem início quando este recebe sucessivamente telefonemas – para um número errado –que deveriam ser dirigido a Paul Auster para que este pudesse impedir a morte do jovem Stillman, a quem o pai – um cientista determinado até à loucura e acabado agora de sair da cadeia –, tinha, na sua adolescência fechado longos anos num quarto para provar uma certa teoria.

    Quinn encontra-se com a mulher do jovem Stillman, igualmente sua enfermeira, que lhe expõe o medo de que o velho Stillman viesse agora matar o filho. Mas ao mesmo tempo, beija apaixonadamente Quinn, que desde então fica irremediavelmente preso a ela.

    O próprio Paul Auster é personagem da história, encontrando-se Quinn com ele várias vezes. O próprio filho de Auster (e aluno de Karasic) surge numa das pranchas.

    Seguindo o velho Stillman, Quinn procura saber o que este pretende, até que, de repente, deixa de poder contactar a rapariga. esta não dá sinal de si. Obcecado, Quinn esconde-se e vigia a entrada da casa onde ela e o jovem Stillman poderão vir a correr perigo. Mas o velho nunca aparece. O detective deixa passar o tempo, a barba cresce-lhe, começa cada vez a comer menos, o corpo e a mente a degradar-se. Até ao fim...

    O VAZIO

    É este vazio, este ritmo, esta tensão interna, os vários mistérios, que Mazzuchhelli e, finalmente, Karasic, conseguem resgatar do romance de Paul Auster para as vinhetas da Banda Desenhada. Para o conseguir, usam vário efeitos de raccord bem conseguidos, vários grafismos clássicos, como a babel, enquadramentos que saltam de planos de pormenor para outros mais abertos. O desenho escapa sempre à tentação do realismo, mesmo quando Paul e seu filho Daniel são retratados.

    A descrição do vazio, da estupefacção, do mistério ficam vivas na feliz adaptação à BD.

    Por: LC

     

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