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    Arquivo: Edição de 31-01-2021

    SECÇÃO: Crónicas


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    A GUERRA COLONIAL PORTUGUESA (17)

    A montagem das máquinas de guerra e algumas notas sobre o ambiente político-social do país, à época

    Enquanto nas colónias os independentistas iam mobilizando combatentes e recursos para o início da luta armada – apoios externos, quer em termos materiais, logísticos, quer humanos, conselheiros militares, mercenários, etc., não lhes faltavam –, por cá, na metrópole, como então se dizia, o clima político-social pouco tinha de pacífico. Na verdade, o governo do ditador António de Oliveira Salazar persistia embalado no seu autismo, fazendo orelhas moucas a tudo o que dele se dizia lá fora, particularmente nas assembleias gerais da ONU (Organização das Nações Unidas), estribado na sua feroz polícia política, a PIDE/DGS, bem como ignorando os argumentos das vozes que por todo o território se iam levantando contra o regime e a sua política ultramarina. Aliás, só as não ignorava para as perseguir, para as silenciar a todo o custo. Num país onde a informação era toda filtrada pelo apertado crivo da censura, só chegava ao público, àquele escasso público que a ela tinha acesso, aquela que quadrasse ao regime e ao governo não criasse qualquer desconforto.

    Num país profundamente marcado pela sua ruralidade, pelo analfabetismo, pela debilidade económica das famílias, onde os jornais, as revistas, não chegavam – e ainda que eventualmente chegassem, não havia dinheiro para os comprar –, apesar de, como se disse, as notícias, os comentários, muito deviam à imparcialidade, à isenção política; onde não havia rádio, nem televisão, a informação era praticamente nula. O mundo, em meio rural, no seu isolamento geográfico e humano, na prática, não ia além das fronteiras estabelecidas pelas linhas do horizonte que os olhos de cada habitante conseguiam alcançar. Vivia-se completamente ostracizado. As carteiras da escola primária cujas salas uniformemente decoradas com o tradicional crucifixo e os excelsos retratos emoldurados a preceito do omnipotente Presidente do Conselho de Ministros, Oliveira Salazar, e do Presidente da República, Américo Tomás, uma mera figura decorativa do regime, também conhecida por corta-fitas, para aqueles que a puderam frequentar, eram o local onde se adquiriam os primeiros conhecimentos que permitiam à imaginação evadir-se das quatro paredes em que se nascera, às mãos duma qualquer parteira improvisada, sem a mínima assistência qualificada de qualquer profissional do ramo da saúde. Depois, seguia-se-lhe a igreja, aquele local sagrado, onde, desde a obrigatória catequese até aos inflamados sermões do alto dos púlpitos, passando pelas homilias nas habituais celebrações eucarísticas, os princípios morais e religiosos, os sagrados mandamentos da lei de Deus eram repetidos até à exaustão pelos respetivos ministros. A ameaça de punição, no juízo final, com o fogo do inferno ou de um qualquer castigo divino – cuidado, Deus castiga sem pau nem pedra! – ainda em vida, tudo concorria para manter o dócil rebanho dentro do seu redil.

    O CAPITÃO HENRIQUE GALVÃO, EM 1961, NA CÉLEBRE OPERAÇÃO DULCINEIA, EM QUE FOI TOMADO DE ASSALTO O PAQUETE SANTA MARIA
    O CAPITÃO HENRIQUE GALVÃO, EM 1961, NA CÉLEBRE OPERAÇÃO DULCINEIA, EM QUE FOI TOMADO DE ASSALTO O PAQUETE SANTA MARIA
    Com efeito, é este povo humilde, atemorizado pelo sobrenatural e pelo Estado, manso, económica e socialmente depauperado, politicamente ignorante, fácil de manipular pelos corifeus do regime, que, de um instante para o outro, é convocado a defender a Pátria do ataque dos seus inimigos. A Pátria como um bem sagrado, tão sagrado como a vida de cada um – exceto se for o governo ou aqueles que ferozmente o protegem (leia-se: a sua polícia política), a dela disporem –, independentemente das razões que possam assistir a quem a tal postura se atreva a opor. Quem sabe sabe e quem manda pode! As (ordens) normas cumprem-se, não se discutem, constituíam máximas dum regime onde era proibido discordar ou sequer manifestá-lo. Enfim, toda uma lavagem ao cérebro de cada cidadão, uma espécie de droga mental e intelectualmente entorpecedora, que o mantinha amordaçado, capaz de transformar um ser humano pensante em mero autómato, um verdadeiro robô às ordens do dono.

    De nada valeram as tentativas de derrube do regime levadas a cabo por intrépidos opositores ao mesmo, das quais nos permitimos aqui realçar as promovidas ou lideradas pelo general Humberto Delgado, que ficou para a História conhecido por O General Sem-Medo, em 1958, na sequência da sua derrota eleitoral nas eleições para a presidência da república e das subsequentes represálias de que foi vítima por parte de Salazar, pois havia publicamente prometido demiti-lo, caso saísse vencedor daquele ato eleitoral, e o capitão Henrique Galvão, em 1961, na célebre Operação Dulcineia, em que foi tomado de assalto o paquete Santa Maria, carregado de passageiros maioritariamente americanos, ao largo das Caraíbas, a fim de alertar a comunidade internacional para o que por cá se passava sob o domínio da ditadura fascista. Recordamos que, após o final da II Grande Guerra, Oliveira Salazar, pretendendo aparentar alguma democracia interna, enfim, apenas para inglês ver, passou a admitir eleições. Só que o único partido consentido era o designado por União Nacional, o suporte do governo, logo, era interdito fazer campanha contra o regime, pelo que, assim sendo, tais eleições não passavam duma verdadeira farsa, destituídas, por isso, de qualquer autenticidade. Estava-se no tempo das ditas chapeladas, em que os seus lacaios se prestavam a depositar nas urnas eleitorais o seu próprio voto e mais os duns quantos que, à partida, sabiam que não iriam votar, pois arriscar-se-iam a ser presos.

    Igualmente digna de realce, para além de outras tentativas menos significativas ou, pelo menos, com menos impacto público, foi a que ficou conhecida por Abrilada de 1961. Com efeito, em abril de 1961, altas patentes da hierarquia militar portuguesa e do corpo do Estado-Maior do Exército, incluindo o próprio Ministro da Defesa Nacional, General Botelho Moniz, levaram a cabo uma tentativa de destituição de Américo Tomás e Oliveira Salazar, respetivamente, dos cargos de Presidente da República e de Presidente do Conselho de Ministros. Causa próxima: a questão colonial, na sequência de graves incidentes ocorridos em Angola, nos primeiros meses desse mesmo ano. Deles falaremos numa próxima oportunidade. É aqui que Salazar assume a pasta da Defesa Nacional e em discurso dirigido à nação, proclama: “se é precisa uma explicação para o facto de assumir a pasta da Defesa Nacional […] a explicação concretiza-se numa palavra e essa é Angola [...] Andar rapidamente e em força é o objetivo que vai pôr à prova a nossa capacidade de decisão [...] a fim de defender Angola e com ela a integridade da Nação”.

    É neste contexto que todos os mancebos com 18 anos de idade, por mais recôndito que fosse o local deste país onde vivessem, vieram a ser chamados a dar o nome, para, no ano seguinte, serem submetidos a inspeção militar e, logo de seguida, mobilizados para a tropa. Até homens que já tinham cumprido o seu serviço militar, voltaram a ser chamados a pegar em armas, pois, segundo o governo da nação, a pátria estava em perigo.

    (...)

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    Por: Miguel Henriques

     

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