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    Arquivo: Edição de 31-05-2017

    SECÇÃO: Crónicas


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    "Pergunta e serás mestre"

    A vida do ser humano é um imenso campo de interrogações não só no que respeita à vida quotidiana mas igualmente ou sobremaneira no plano metafísico. Antes mesmo de aprendermos a expressar os nossos desejos e preocupações com recurso à linguagem, fazemo-lo por sinais, desde o choro inicial ao movimento dos órgãos de visão, audição e tato e a uma incipiente mímica que, pouco a pouco, os mais crescidos aprendem a descodificar. A urgência de ver entendidas e satisfeitas as suas necessidades básicas desenvolve o potencial cognitivo da criança e apressa o seu domínio sobre o mundo que a rodeia, ainda que essa atividade não seja cabalmente apercebida pelos mais crescidos. A apropriação do mundo não é de todo explícita mas ela realiza-se com tamanha ou maior intensidade e urgência do que a do adulto. Num processo contínuo e cada vez mais amplo, vai procurando respostas para as questões que a si própria se coloca. Para os que a rodeiam é difícil "ler"grande parte dessas perguntas/respostas e a forma como é realizada essa troca interior que varia de um ser para outro e que só parcial e gradualmente vai sendo desvendada por reações a estímulos externos. A aquisição da fala já de si manifesta uma infinidade de indagações que a criança autoformula e a que vai descobrindo respostas cada vez mais aperfeiçoadas. A posse desse meio de comunicação fornece-lhe uma energia acrescida fomentadora de um ainda maior número de interrogações. O processo de socialização - na família, na comunidade, na escola - desperta e desenvolve progressivamente a capacidade de se autointerrogar e de indagar em torno. Esse atributo alcança pleno desenvolvimento na idade adulta e só decresce quando sobrevem algo que reduz o seu potencial cognitivo. O conhecimento individual não pode, pois, dissociar-se do coletivo e só na interação entre um e outro se realiza plenamente. Queiramos ou não, a nossa vida é também a vida do outro, dos outros.

    O tipo de questionamento que fazemos em contínuo deriva, em larga medida, da nossa posição face aos demais. Em famílias com baixo nível de escolaridade, inserida em meio social e cultural pouco estimulante, a permuta de conhecimento torna-se difícil, pouco motivadora e menos rendosa. Em contraste, a ânsia natural do saber encontra terreno mais fértil em meio familiar e vicinal exigente. Ao longo dos séculos os avanços técnicos e científicos foram gerados e desenvolvidos por homens originários de meios culturais privilegiados até ao dealbar dos tempos modernos em que o saber se tornou mais inclusivo para quem provinha de comunidades menos favorecidas. É sabido que, durante o Renascimento, grandes vultos das Artes e das Ciências de escassos bens materiais desenvolveram as suas criações sob o patrocínio de membros da Grande Nobreza ou do Alto Clero. Seja qual for a situação do individuo impõe-se "a circunstância", que o filósofo espanhol Ortega Y Gasset tão bem explicitou e que os menos refletidos designam por sorte oupelo seu contrário. Segundo estes, algumas das descobertas científicas e realizações artísticas determinantes no evoluir da Humanidade ocorreram "casualmente", favorecidas por situações fortuitas. Menorizam assimo esforço aturado dos seus autores e colaboradores na consecução dos objetivos a que se propuseram. O caso porventura mais referido está ligado a Alexander Fleming, o responsável pela descoberta, em 1928, da Penicilina que está na base dos antibióticos que tantas vidas têm salvado. "Médico e investigador inglês, Fleming encontrava-se a trabalhar no seu laboratório em Londres (habitualmente desarrumado) no mês de setembro de 1928 realizando várias experiências. Ao inspecionar uma das suas culturas antigas antes de destruí-las, notou que a colónia de um fungo havia crescido espontaneamente como um contaminante numa das Placas de Petri semeadas com staphylococcus aureus. Fleming observou outras placas e comprovou que as colónias bacterianas que se encontravam ao redor do fungo, mais tarde identificado como Penicillinium notatum, eram transparentes devido a uma lise bacteriana. A lise significava a morte das bactérias e, neste caso, das bactérias patogénicas crescidas na placa" (Wikipédia - a Enciclopédia Livre). Como se constata, embora a descoberta não tivesse resultado da comprovação de uma hipótese previamente formulada, método seguido na investigação científica, existiu intencionalidade nos procedimentos a ela conducentes pelo que não é de todo correto afirmar-se que terá sido fruto do acaso. Apesar de não imediatamente reconhecido pela comunidade científica britânica, Alexander Fleming veio a ser laureado com o Prémio Nobel de Fisiologia ou Medicina, em 1945, junto com Howard Florey e Ernst Boris Chain, farmacêuticos norte-americanos responsáveis por terem criado uma maneira de extração e de purificação da penicilina e pela condução dos ensaios clínicos. Também é comum afirmar-se que a invenção da roda, vulgarmente considerada a maior descoberta do ser humano, terá resultado da curiosidade de um nosso longínquo antepassado, postado na margem de um rio, ao ver o movimento circulatório de troncos de árvores levados pela corrente, logo, fruto do acaso, mas igualmente da reflexão, divulgação e aproveitamento em consequência dessa observação acrescentamos nós.

    Vivemos numa época em que se regista um notabilíssimo incremento da cultura fruto de cada vez maior valorização do saber. O ensino e a investigação já não são privilégio de alguns países, de centros universitários dotados de grandes mestres e de laboratórios sofisticados. Multiplicaram-se escolas a todos os níveis, foram criadas melhores condições de aprendizagem, generalizou-se a convicção de que todos os seres humanos têm direito à educação e aos benefícios que do seu enriquecimento resultam. Justificadamente, cada vez mais países dão prioridade à valorização cultural dos seus cidadãos.

    Se as sociedades se mobilizam deste modo é porque o homem tem sede de conhecimento. A força de vontade individual há-de ser, pois, determinante na escolha dos caminhos que a ele conduzam. É verdade que nem sempre temos alguém que possa responder às nossas perguntas ou às nossas dúvidas mas existem muitas fontes onde podemos saciar-nos como sejam os livros e, mais recentemente, a Internet. Assim nós o desejemos.

    Por: Nuno Afonso

     

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