Bom Ano Novo!
Claro que o futuro é sempre incerto e que prognósticos acertados são os que fazemos no fim dos jogos.
Mas o certo é que entramos em 2017 com a alma inquieta, relativamente ao que nos espera no ano que agora começa.
Habituados, desde há mais de 40 anos - que são os que leva de idade o nosso regime democrático -, a ter uma vida pacata, neste recanto de tranquilidade onde a Europa fita o mar Atlântico, mal nos damos conta do desassossego que percorre as fronteiras dessa Europa que integramos e que, em alguns episódios, já nos aparece também dentro dessas fronteiras.
Pobretes, mas alegretes - é um retrato que nos cola bem à pele; e, na verdade, embora o nosso País mantenha, no essencial, a pobreza que quase sempre o caracterizou ao longo da História, e as desigualdades sociais que a acompanham, temos preservado, nas últimas décadas, o dom inestimável das liberdades civis, da tolerância e da convivência democrática, tão escassas ao longo da nossa História.
É esse conjunto de virtudes cívicas que constitui o cimento que conformou a União Europeia (que é hoje o principal lugar de afirmação do nosso País), no sopro vital que a instituiu no pós-guerra.
Mas, de facto, a fronteira externa da União, dos Países Bálticos à Ucrânia, do Cáucaso à Turquia e ao Médio Oriente, do Egipto à Líbia, parece erguer um cordão de insegurança à nossa volta, deixando apenas como espaço de respiração desoprimido a face atlântica da Europa.
E mesmo cá dentro, neste reduto que nos habituámos a pensar - creio, apesar de tudo, com razão - como o melhor espaço do mundo para viver, os próximos tempos serão de incerteza, na peugada do que já se vem insinuando desde há algum tempo.
Com efeito, o crescimento de sentimentos de intolerância e rejeição dos outros, dos que pensam de modo diferente ou nasceram noutras bandas, com a emergência dos nacionalismos e das pulsões autoritárias que sempre os integram, fere no mais fundo o tom cosmopolita e integrador que é a principal "griffe" do nosso mundo ocidental.
Os resultados das eleições americanas, o ressurgimento da vocação imperial e expansionista da Rússia, a deriva populista ou autoritária no Reino Unido, na França ou na Hungria, e em tantos outros lugares que pensávamos imunes a tal retrocesso, como a Holanda, vão marcar o ano que agora começa sob o princípio da incerteza.
Uma das desvantagens deste mundo global em que vivemos é que muito do que se passa fora do nosso controlo terá efeitos entre nós - mesmo que não acreditemos que o bater de asas de uma borboleta na China pode alterar a vida neste outro lugar do vasto mundo.
Pois não é certo que, ainda há dias, o Primeiro-Ministro António Costa referiu não ser de pensar sequer em falar da renegociação da dívida pública portuguesa antes das eleições da Alemanha?
A União Europeia tem trazido aos países que a integram, segundo penso, inumeráveis vantagens; mas também dissabores, e muitos, que têm afastado os eleitores e os povos do ideal europeu.
Será porventura o tempo - se ainda for a tempo - de pôr um travão às tendências que vêm transformando Bruxelas num novo centro de poder, sem legitimidade democrática directa, centralista e burocrático, em benefício de um aparelho ao serviço de si próprio.
Para evitar deitar fora o menino com a água do banho.
Bom Ano Novo!
Por: Henrique Rodrigues
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