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    Arquivo: Edição de 30-05-2012

    SECÇÃO: Música


    Entrevista com Alberto Mateus – presidente da AACE

    Alberto Mateus, Diretor da Associação Académica e Cultural de Ermesinde (AACE). 60 anos completados recentemente. Licenciado em Gestão pela Universidade Lusíada e com formação específica em Finanças Empresariais. Trabalhou durante 32 anos na autarquia de Valongo. Tem dois filhos. Vive em Ermesinde há cerca de 30 anos mas é de origem duriense.

    Fotos FILIPE CERQUEIRA
    Fotos FILIPE CERQUEIRA
    Na juventude, nos seus gostos musicais não entrava o Fado nem a Música Tradicional Portuguesa. Hoje em dia aprecia e tenta ir a todas as tertúlias de Fado, tal como a todos os concertos onde possa ver e ouvir boa Música Tradicional Portuguesa: «Para alguém que durante muitos e muitos anos lidou exclusivamente com números, é uma mudança significativa estar a dirigir os destinos de uma associação cultural. As dificuldades de logística, os desejos de intérpretes e maestros, as histórias de teatro e as danças dos mais miúdos: tudo em volta da arte e não dos números. Não me imaginava há 10 anos neste meio, nestas funções. É uma vivência diferente».

    De espírito jovial mas com uma voz momentaneamente bastante rouca – quase obrigando ao adiamento da entrevista –, foi desta forma que Alberto Mateus nos recebeu nas instalações da AACE numa tarde solarenga. Começamos a nossa conversa visitando as instalações da associação: simples, com instrumentos adequados e com salas minimamente razoáveis para necessidades acústicas. Estando dispersas por vários locais, as salas desdobram-se para música dança e teatro, sendo-nos explicadas como e quando funcionam as aulas e em que espaços. É num desses espaços que vamos encontrar as fotografias dos sócios fundadores da AACE: Faria Sampaio (médico) e Joaquim Teixeira (professor do Secundário) e do primeiro maestro, Manuel d’Almeida (que não foi sócio fundador).

    A escritura da formação da associação foi realizada a 15 de abril de 1989, com mais sócios fundadores. Conta-se que a criação da AACE não foi uma forma de criar um espaço para albergar um coro já existente, pois o coro ainda não estava formado, mas sim por carolice. Um dia houve uma excursão de algumas pessoas de Ermesinde em que algumas delas começaram a cantar. Por brincadeira alguém terá dito: E por que não criar um Coro?, ideia que Faria Sampaio agarrou logo de seguida, dando corpo à formação de uma associação em termos legais e depois seguindo-se a constituição de um Coro, com uma formação e um repertório que não fosse de raiz litúrgica, como já havia em Ermesinde.

    Ao longo dos anos foram sendo criados vários grupos – de Música Tradicional Portuguesa, de Fados, de Teatro, de Cantares (chamado Voz Ligeira), Coral Juvenil, que recentemente se passou a chamar Arco-Íris (notícia já referida neste jornal), e escolas: de Música, de Dança e uma específica de Cavaquinho que, nas palavras de Alberto Mateus, «sendo um instrumento mais tradicional, me diz mais sentimentalmente em termos associativos do que a Escola de Música (que alberga outros instrumentos). Uma ideia subjacente à criação da Escola de Cavaquinho é a de proporcionar mais elementos, posteriormente, ao Grupo de Música Tradicional Portuguesa.

    Esta associação continua a ser única na sua abrangência de atividades artísticas que proporciona à cidade de Ermesinde. Existem outras associações, como a Ágorarte - Associação Cultural e Artística, que em muito enobrece a nossa cidade, mas que estão de raiz mais vocacionadas para uma área artística específica, umas mais para o teatro, outras para a literatura, outras para a dança».

    “A Voz de Ermesinde” (AVE) - Quantas pessoas são abrangidas pelas actividades da AACE?

    Alberto Mateus (AM) - Semanalmente, 200 pessoas passam pela AACE, de todas as idades.

    AVE - Desde a sua formação, qual tem sido a variação do número de associados da AACE?

    AM - O número não para de subir, são à volta de 650. E os participantes têm vindo a aumentar em número desde o início, conforme foram surgindo os diversos grupos e escolas ao longo dos anos. Infelizmente, este ano houve uma excepão no que respeita à Escola de Música, onde se notaram maiores dificuldades das famílias em inscreverem os seus filhos. Houve um decréscimo de 50% no número de participantes.

    AVE - O número crescente de escolas de música em Ermesinde também poderá ajudar a explicar esse decréscimo?

    AM - Penso que não. A associação oferece preços significativamente inferiores aos associados comparativamente aos oferecidos noutras escolas, uma vantagem do movimento associativo.

    Penso que, pelas conversas que tive com vários pais, estes demonstraram ter de fazer escolhas face às dificuldades financeiras vigentes. Escolhas entre a prática por parte dos filhos de uma arte ou de um desporto, ou mesmo entre, por exemplo, a dança e a música no seio da AACE.

    AVE - A qualidade do ensino é desta forma afetada?

    AM - Os professores são recrutados pelo seu currículo e escolhidos dentro de uma perspetiva de grande qualidade.

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    AVE - De que tipo são os intercâmbios em que participam?

    AM - Sobre os diversos intercâmbios em que a AACE participa, refiro a organização anual do Encontro Internacional de Coros da Cidade de Ermesinde, na 5ª edição este ano. Não havendo qualquer pedido de pagamento da nossa parte para a participação dos grupos que nos visitam, passa a ser uma retribuição sermos convidados às cidades desses mesmo grupos; deste modo se facilita e encoraja o intercâmbio. As saídas dos diversos grupos são fundamentalmente de três origens: apoio a atividades de solidariedade, como por exemplo do Centro Social de Ermesinde e de outras entidades de outras cidades; por intercâmbio cultural, como atrás referido; no âmbito da prestação de serviços, como por exemplo as festas de Santa Rita que se aproximam.

    Esta facilidade é uma exceção para o Grupo de Teatro. Por duas razões: problemas logísticos relacionados com a falta de auditório próprio e a necessidade de ter de participar nas atividades de outras companhias por nós convidadas que possam vir a atuar no auditório do Fórum, já que a Câmara, com a devida antecedência dos nossos pedidos, nos disponibiliza o auditório para atividades da AACE e não para espetáculos exclusivos de outras associações, mesmo que por nós convidadas.

    AVE - De que forma é possível manter a estabilidade financeira numa associação com estes encargos em deslocações dos grupos e diversas atividades artísticas das Escolas?

    AM - Nos primeiros tempos de criação de uma nova atividade, ela será, sabemos nós, deficitária. O que se procura é que não seja a longo prazo deficitária. Pode sê-lo num ano, mas no seguinte terá de compensar. A rentabilidade de um projeto trabalhado durante meses por um grupo ou escolas advirá da aquisição dos nossos espetáculos por parte de autarquias e outras associações. Isto pode acontecer a curto ou longo prazo.

    AVE - Que tipo de apoios, se os há, são recebidos da vossa parte?

    AM - Não existe apoio nenhum. Quanto a nós, AACE, a política de atribuição de subsídios por parte da Câmara Municipal de Valongo é a mais correta. No passado, estas ofereciam dinheiro em função de critérios que eram muito subjetivos. Neste momento assinam protocolos com algumas associações que têm como contrapartida o fornecimento de prestação de serviços por parte destas. Exemplo disso é o protocolo anual de coorganização do Encontro Internacional de Coros que atrás referi. A contrapartida será, por exemplo, a participação de Grupos da AACE na feira de Artesanato ou na feira do Livro, etc.. Não há, assim, atribuição direta de qualquer verba monetária. O mesmo se passa com a Junta de Freguesia, que nos paga em função dos eventos que lhe prestamos nas suas atividades e festas.

    AVE - A divulgação destes nem sempre é feita da melhor forma e/ou com a maior abrangência.

    AM - A Câmara fornecia uma agenda cultural trimestral em forma de brochura a qualquer cidadão que se inscrevesse no seu setor da Cultura. Já tivemos oportunidade de transmitir a nossa opinião ao Dr. João Paulo Baltazar, vereador da Cultura da autarquia de Valongo. Falta dar maior e melhor visibilidade ao movimento associativo. Valongo é um município onde o movimento associativo é forte. Mas compreendemos que os custos seriam elevados, que as remessas postais seriam dispendiosas, havendo necessidade de cortar despesas.

    AVE - Qual a sua opinião quanto ao conhecimento por parte da população ermesindense das atividades da AACE?

    AM - Ainda sou do tempo em que, enquanto jovem, para ver cinema, teatro ou um jogo de futebol tinha de ir ao Porto. Ermesinde era uma cidade-dormitório, não tinha vida própria. Felizmente, isso mudou. Os nossos associados fazem um ótimo passa-palavra e, como foi visível nas atividades mais recentes por ocasião do 13º aniversário da AACE, os concertos encheram-se de público. Isto acontece porque queremos apresentar sempre concertos com qualidade. Mesmo havendo contratempos, de vez em quando, por razões técnicas ou outras, tem havido uma opinião bastante positiva da cidade em tudo o que tem sido apresentado pela associação. Mas queremos sempre melhorar.

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    AVE - Nestes 13 anos a AACE já terá um nome firmado junto do público? Se sim, que objetivos prossegue?

    AM - Sim, demonstrando que é alternativa até para certos espetáculos que por vezes se realizam ao ar livre e que são de qualidade duvidosa. Custa--me estar a referir nomes, mas terei de o citar. Uma autarquia é capaz de pagar milhares de euros a um Tino de Rans e é capaz de se esquecer de que tem bons grupos na cidade e no concelho e que, por montantes inferiores poderia obter bons espetáculos.

    Como desejo primeiro e objetivo futuro, a AACE pretende concretizar o sonho da construção da sede. Existem já terrenos para efeitos de construção, com um projeto de uma arquiteta já aprovado para a futura sede da AACE, que na altura custaria à volta de 400 mil euros, sendo que no presente momento até poderia, previsivelmente, ser de valor inferior. Teria, entre outros espaços, no rés-do-chão um auditório para cerca de 100 lugares, uma cave, uma secretaria, um pequeno bar; no 1º piso várias salas de aulas para a Escola de Música, uma sala de ensaios para o órfeão. (Um pormenor delicioso que não podia escapar aos olhos do entrevistador foi um espaço de teto descoberto livre que envolveria uma árvore a brotar do rés-do-chão até acima do 1º piso!).

    Em condições normais teria financiamento, mas as verbas do QREN estão quase todas inviabilizadas para as autarquias. A autarquia de Valongo cede o terreno mas, ficando fiadora do projeto, logo ficaria com mais um encargo que aumentaria o seu nível de endividamento que, como acontece em muitas mais autarquias do país, já ultrapassou o seu limite. O direito de utilização seria da AACE mas o terreno seria sempre propriedade da Câmara valonguense.

    Este é um impasse que a Direção da AACE quer resolver o mais rapidamente possível.

    (Na opinião deAVE este edifício seria algo completamente novo para Ermesinde, pois não existem espaços criados de raiz, com características acústicas próprias e direcionadas para o ensino de diversas artes, principalmente da música. As escolas artísticas existentes situam-se em espaços habitacionais ou arrecadações cedidas e alteradas para o efeito, o que, com a melhor das intenções, não é suficiente).

    Outro desejo para o futuro é manter as atividades em pleno funcionamento nesta conjuntura político-económica. As atividades diversificaram-se. Naturalmente que gostaríamos de poder abrir mais valências. No entanto, cada vez fica mais complicado e difícil lidar com tantas atividades, havendo a necessidade de disponibilização quase total à Direção de uma associação. Não há desta forma previsão para a curto prazo se criarem mais atividades.

    (Em nome pessoal e do jornal, gostaria de agradecer de novo a hospitalidade com que AVE foi recebida, a amabilidade em responder a todas as questões. Um grande agradecimento também para todos aqueles que fizeram e fazem parte das atividades da AACE por forma a manterem vivo um baluarte da arte em Ermesinde!).

    Por: Filipe Cerqueira

     

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