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Edição de 31-03-2024
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    Arquivo: Edição de 30-10-2009

    SECÇÃO: Crónicas


    O sol do nosso (des) contentamento?

    Muitos têm sido os economistas e historiadores que se têm questionado e tentado encontrar uma justificação para o facto de existirem nações ricas e nações pobres e muitos são os factores em análise, uns “positivos” e outros “negativos”, que poderiam concorrer para essa justificação, mas muitos deles “anulam” os raciocínios que se tentam fazer. Por exemplo, a existência ou inexistência de recursos naturais num país para se poder afirmar que seria, por isso, um país rico, se os tivesse, mas pobre, na falta deles. Como sabemos, algumas nações têm recursos naturais e, contudo, são pobres e o inverso também é verdadeiro.

    Há, contudo, um factor que parecer ser muito importante nessa análise e que é o Clima. Mas o que é um “bom clima” que influencia, ou influenciou no passado, assim tanto o desenvolvimento e a riqueza de um país ou região? De facto, cada tipo de clima (frio, moderado ou quente) influencia e de que maneira, toda a envolvente e, por força disso, alguns dos recursos relacionados com essas condições climatéricas. Mas não vou por esse caminho de análise mas sim pela influência comportamental (sem esquecer a saúde) que o clima exerce na população duma região ou país.

    Por isso e parecendo paradoxal, são os países mais frios do hemisfério norte que são os mais ricos, mesmo aqueles que não tiveram nem têm recursos naturais, podendo concluir-se, empiricamente e de uma forma simplista, que o clima mais frio influencia os cidadãos nos seus comportamentos, na produtividade e no desenvolvimento. Olhemos para o “mapa-mundo” e verificamos que os países mais ricos estão a norte e os mais pobres a sul. Por que será que os nossos emigrantes têm uma atitude para com o trabalho bem diferente nos países de acolhimento? Não será por causa do “clima” aqui em sentido lato, mas também em sentido figurado, isto é, o “clima social e cultural”?

    Poderíamos, assim, pensar que o nosso clima, considerado um “clima temperado” e por isso sem os rigores e dificuldades dos climas frios do norte da Europa e tórridos dos países mais a sul ou de Africa, nos favoreceria na produtividade, mas infelizmente perdemos essa “vantagem competitiva” porque este nosso “doce clima” influencia-nos negativamente nas nossas atitudes para o trabalho e, consequentemente, para o nosso desenvolvimento económico e social. Este sol que nos “banha” durante muitos dias do ano, acaba assim por ser um forte convite para o ócio e “gerador” de uma má vontade para tudo aquilo que implique sacrifício (estudo, trabalho, etc.). Cultivamos assim, uma forte “atitude da cigarra” que se reflecte também noutros comportamentos, esquecendo-nos que a “atitude da formiga” é fundamental para o nosso desenvolvimento individual e colectivo. Além disso e para reforçar essa nossa tendência para o ócio e atitudes anti-trabalho, temos uma imensidão de praias, pelo que o desafio é ainda mais forte. Assim, aqueles que (ainda) consideram que o trabalho (em qualidade e em quantidade) é o mais importante factor para o desenvolvimentos dos povos, têm que lutar contra as condições climatéricas convidativas para tudo menos para o “sacrifício” que é o trabalho e, acima de tudo lutar contra a mentalidade instalada na nossa sociedade, isto é, uma cultura anti-trabalho. Um “bom dia” para nós é aquele em que o sol brilha e a temperatura ronda os trinta graus. Se chove, logo o “povo” maldiz a sua sorte e fica taciturno, esquecendo-se até que as alfaces vão estar mais caras, se houver falta da água da chuva, por exemplo!

    À falta de outros recursos significativos, poderíamos admitir que o sol e as praias seriam “a nossa galinha dos ovos de ouro”, para a nossa economia, mas até isso estamos a estragar. Mas será que o sol e as praias são suficientes para manter um turismo de qualidade e que seja gerador de emprego e de riqueza para o nosso país? É pouco, até porque têm sido cometidos muito “atropelos”, na paisagem, no urbanismo (moderno e antigo) e na preservação do património monumental e cultural, onde há já muitas perdas, algumas irrecuperáveis. Há, felizmente, muitos e bons exemplos por esse país fora, mas cujos “ganhos” não “compensam” as perdas verificadas em muitas outras situações e regiões. Ao percorrermos o país, encontramos muitas situações de “lesa património”, pelo que assim não vamos a lado nenhum, ou, se quisermos, acabaremos por perder aquilo que de diferente nos faz dos outros povos e onde o sol pode dar um outro “brilho” ao nosso património, incluindo a amabilidade e a simpatia do nosso povo, para alem dum nível de preços que (ainda) faz grandes diferenças para aqueles turistas que optam por nos visitar. Mas, para onde e por onde viajam os nossos cidadãos, os nossos políticos e, principalmente, os nossos autarcas que não vêem ou não querem ver aquilo que de bom se faz e preserva lá fora e em países desenvolvidos, muitos deles que não têm este nosso clima que acaba, assim, por ser a causa do nosso (des) contentamento? Fala-se muito em turismo, logicamente como fonte geradora de riqueza, mas quase sempre a pensar nos turistas externos, mas os cidadãos nativos, enquanto residentes e ou como turistas internos também merecem que o nosso património e cultura sejam preservados e valorizados. Porque é também a qualidade de vida que está em causa, para nós, e, por isso, também os cidadãos devem ser parte activa nesta matéria. Imite-se o que de bom fazem outros povos, muitos deles que pelo facto de não terem “sol e praias”, como nós, privilegiam outros valores, nomeadamente outros hábitos e o património.

    Sol, praias (cada vez mais em risco) e preços baixos (em crescendo, por efeito do euro) podem deixar de ser suficientes para atraírem turistas ao nosso país. É necessário fazer muito mais, sem esquecer a população residente. Ou bastam-nos os centros comerciais como pontos de interesse turístico e “cultural”? Se assim for, pobres de nós portugueses.

    Por: Serafim Marques*

    (*) Economista

     

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