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    Arquivo: Edição de 30-03-2007

    SECÇÃO: Editorial


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    Só é cego quem não quer ver

    Mais uma vez olho a natureza nestes primeiros dias de Primavera: as árvores rebentam, as flores saltam da terra, mesmo aquelas que nascem entre pedregulhos.

    A Páscoa aproxima-se e as flores fazem tapetes ao longo dos caminhos.

    Comemora-se o Dia do Pai, o Dia da Poesia, o Dia da Árvore, o Dia do Teatro e, paralelamente, abrimos os jornais e a palavra corrupção é título de primeira página.

    Que a corrupção existe nos diferentes sectores da sociedade, todos nós sabemos, mas que ela atinja um volume tão significativo como hoje deixa-nos perplexos.

    Esta geração de “chico- -espertos”, para quem há sempre uma justificação, é que me incomoda, a banalização do incumprimento dos deveres de cada um.

    Não é sem mágoa que vemos figuras que pelos cargos que ocupam teriam que ser exemplares, e que vemos?

    Que moral, que pedagogia pode existir em estabelecimentos de ensino onde os certificados são passados sem rigor, que nem as datas respeitam?

    Não me espanta que apareçam denúncias nos jornais sobre ensinos particulares paralelos a que o ensino oficial deu cobertura. Recordo que fiquei profundamente escandalizada numa reunião realizada no Liceu Pedro Nunes, em Lisboa. Comparavam-se as médias dos exames a Geometria Descritiva e lembro-me de ter ficado muito admirada com o volume de anulações da frequência no 1º e 2º períodos. Quem não tinha classificações muito altas anulava. No fim do ano ficavam apenas inscritos os alunos ou muito fracos ou com classificações de 19 e 20 no exame final. Perguntei a um professor, muito competente e responsável pelo ensino da Geometria neste país, como explicava esta situação.

    Na altura, era claro, todos os alunos que anulavam tinham explicações particulares ou iam para colégios. No fim dos períodos distribuíam-se panfletos na entrada do liceu seduzindo e anunciando aulas de recuperação em termos tais que eu nunca tinha visto aqui no Porto. Mas esse professor acrescentava que nos dias de exame a distribuição de novos panfletos era ainda maior, incitando à revisão de provas. Lembro-me de ter ficado profundamente escandalizada com essa situação.

    Quando se reviam programas, ouviam -se comentários: esta matéria é muito importante mas só é leccionada no ensino oficial. Alguém dizia – eu próprio não a dou aos meus explicandos!

    Noutros locais se calhar passava-se o mesmo, mas havia vergonha e não se contava.

    Hoje tudo isto é banal, justifica-se tudo, ensinam-nos a não ver…

    E porque é Primavera, vésperas de Páscoa, viva a Poesia…

    POEMA DE DOMINGO DE PÁSCOA

    No domingo de Páscoa

    vi um cego a almoçar num restaurante.

    Levava o garfo à boca, e entretanto sorria,

    candidamente,

    como só os cegos sabem sorrir:

    Comia frango, e ao servir-se do garfo ora trazia

    comida nova, ora coisa nenhuma,

    ora tendões e peles já antes mastigadas,

    ou tudo junto,

    dependurado de qualquer maneira,

    sorrindo sempre candidamente.

    Eu então levantei- me e, assim mesmo,

    de sapatos castanhos,

    calças e casaco da mesma cor,

    alto, magro e bastante calvo,

    aproximei-me dele

    e disse-lhe, imperativamente:

    - Abre os olhos!

    Que cegueira!

    De: António Gedeão

    Por: Fernanda Lage

     

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