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    Arquivo: Edição de 15-01-2007

    SECÇÃO: Crónicas


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    O mundo de amanhã

    Hoje ninguém se espanta com os avanços da ciência e da técnica e aos mais jovens parece natural tão rápida evolução. Como tantas vezes se diz, a propósito de certas competências extraordinárias que alguém possui, as novas gerações parece terem nascido ensinadas, ao menos com assombrosa predisposição relativamente ao uso dos produtos de alta tecnologia. É um espectáculo vê-las manusear os telemóveis, as consolas, os computadores, e todo o diversificado conjunto de aparelhos electrónicos que inundam o mercado e lhes aguçam o apetite. Provavelmente seguirão adiante atentos ao que sobrevier, ainda que tenham de estugar o passo de momento a momento, o que vai sendo comum para todos, dos pequenos aos idosos, nos grandes centros ou nas mais remotas aldeias, no pequeno rectângulo que habitamos ou em qualquer recanto deste mundo globalizado. E o ritmo de aceleração vai aumentando, dia após dia, sem que sejamos capazes de imaginar um limite, tal como acontece nas corridas de velocidade a alto nível competitivo.

    O DOMÍNIO

    TECNOLÓGICO

    As gerações mais antigas vêem-se em sérios apuros, mormente porque lhes vai sendo exigido o recurso a alguns destes produtos da era em que vivemos no exercício quotidiano da cidadania. Há sempre alguém que resiste como noutro contexto dizia Manuel Alegre mas, passo a passo, o remédio é ceder, sob pena de ficar para trás com as piores consequências que do facto podem advir. Os que não conseguirem experimentarão grandes dificuldades para recolar. Vae victis, deles se há--de dizer, porque, no futuro que se anuncia estarão marginalizados sem remédio. Serão os equivalentes dos analfabetos que hoje, infelizmente, ainda conhecemos.

    Ilustração RUI LAIGINHA
    Ilustração RUI LAIGINHA
    Não importa se os novos prodígios dominam os símbolos e os signos que têm orientado a tradicional aprendizagem, se lêem com desembaraço e se se exprimem, oral e graficamente, sem hesitações, se possuem grandes conhecimentos livrescos ou “de experiência feitos” na consagrada expressão do nosso épico. Mais importante que tudo será o domínio tecnológico, a nova religião e a única cultura assim reconhecida. A humanidade caminha para a uniformização cultural a par da actividade económica global a que nos vamos habituando. A identidade dos grupos humanos poderá ter os dias contados. Não demora, deixaremos de nos distinguir por pertencermos a uma determinada nacionalidade, a uma região, a uma profissão ou até a uma família. Para trás ficarão, sem possível retorno, as tradições, os procedimentos, as praxes, os costumes, os valores que enformaram a nossa maneira de ser e de agir perante o mundo até ao presente. Serão apenas folclore, antiguidades e, quando muito, confinar-se-ão a museus, autênticos cemitérios que para alguns serão motivo de reverencial evocação; para outros objecto de orgulhoso distanciamento, de piedade, se não de escárnio.

    «Coitados! Reparem como deviam ser infelizes os nossos antepassados com tantas dificuldades e complicações! Gastavam imenso tempo a deslocarem-se para aqui e para ali em tarefas desgastantes que hoje realizamos com toda a facilidade! Até para se divertirem era uma canseira!».

    Serão eles, efectivamente, mais felizes com tantas comodidades, sem nada que os distinga, talvez utilizando um único idioma (velha aspiração da humanidade mas com pressupostos diferentes), sem referências de grupo, em total alienação? Talvez, mas, como diria o lobo da fábula que o seu parente canino pretendia converter a hábitos domésticos, mais vale passar fome e perseguições desfrutando de liberdade do que usufruir de todo o conforto e prazer perdendo o direito à individualidade e ao sentido de pertença.

    Todavia há dois considerandos que é forçoso admitir: em primeiro lugar o raciocínio, que acima expendi, pode ser uma enorme tolice e aceito humildemente o direito que o leitor tem de dizê-lo, ainda que de si discordando, e note que esta formulação corresponde à de Voltaire no já distante século XVIII; depois, ainda que o não seja, quem nos garante que assim ocorrerá no futuro? A Sociologia, que nasceu como Ciência na primeira metade de oitocentos, (é comum dizer-se que ocorreu em 1822 com Auguste Comte, o chamado “pai do Positivismo”) embora formule hipóteses como as suas irmãs, desde o início reconheceu quão falíveis são as previsões quanto às inter-relações humanas bem como nas análises que se façam ao seu devir. Daqui se conclui que poderia estar muito correcta a minha posição e falhar na prática. Quantas teorias de magnífica e inatacável correcção vieram a falhar estrondosamente quando aplicadas? Basta atentar na obra de Marx e Engels para comprovar o que venho dizendo. Sem qualquer desprimor para os autores e para o mérito das mesmas, naturalmente.

    Por: Nuno Afonso

     

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