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    Arquivo: Edição de 20-12-2006

    SECÇÃO: Opinião


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    Apito dourado

    Desde finais de Abril de 2004 que um processo conhecido pelo “Apito Dourado” faz o seu caminho nos corredores da justiça portuguesa envolvendo várias pessoas do mundo do desporto, mais concretamente do futebol, acompanhadas de alguns autarcas, processo que tem dado causa a muitas e variadas abordagens nos meios de comunicação social, com destaque para os jornais e televisões, estas com o privilégio de muitas vezes terem adivinhado o que iria acontecer de imediato ou no dia seguinte para, com um sopro de telepatia, beneficiarem da coincidência de terem as suas câmaras apontadas às residências visitadas por agentes da Polícia Judiciária, seguindo o percurso e registando o momento em que alguns arguidos foram presos para prestarem declarações nas instalações da PJ ou no Tribunal de Instrução Criminal. “Furos” jornalísticos que bem mereceriam que as entidades competentes já tivessem diligenciado de forma a ver se da contabilidade dos órgãos de comunicação social não haverá por lá alguns lançamentos de saídas de dinheiro indocumentadas, que eliminem a presunção de “furos” jornalísticos originários de coincidências. Num mundo em que não há almoços grátis, custa aceitar que tudo aconteça por obra do acaso.

    O processo em causa, com mais de dois anos de existência, tem mobilizado recursos policiais e judiciários que, por a ele estarem alocados não podem ser mobilizados para outras suspeitas que, infelizmente, não escasseiam no país. Sem esquecer que dele farão parte acusações de agressões físicas que poderão integrar o quadro penal de terrorismo e de haver outras que poderão indiciar práticas lesivas da economia e finanças públicas, parece que a maioria dos factos sob investigação têm a ver com comportamentos de “actores” desportivos que, usando e abusando das funções emergentes do exercício dos cargos que ocupam nas estruturas do futebol, terão falseado a verdade dos resultados, beneficiando e prejudicando árbitros nas suas classificações, engenhoso processo de condicionar os “juízes” nas suas arbitragens, sob pena de sofrerem as consequências da sua rebeldia.

    ÓRGÃOS

    DE COMUNICAÇÃO

    E AUDIÊNCIAS

    Compreendemos que os amantes do futebol se sintam revoltados com as notícias de que o seu clube foi prejudicado pela actuação desonesta de determinada equipa de arbitragem e, em consequência, devorem as notícias relacionadas com o processo Apito Dourado. Conhecedores deste estado de alma dos adeptos do futebol, os media procuram contribuir para que a chama se mantenha viva, condição necessária para que as tiragens de jornais e revistas se vendam e os espaços televisivos registem elevadas audiências. Como se vê, nem tudo é mau.

    Incompreensível para nós, são os recursos consumidos com a parte do processo que tenha a ver com as visitas dos árbitros a casas de dirigentes em vésperas de jogos em que vão actuar, ou de companhias que lhes tenham sido asseguradas em quartos de hotéis para maior conforto, ou se destas práticas, efectivamente, resultou adulteração dos resultados dos respectivos jogos. Isto, porque julgamos ser matéria que deverá ser objecto de tratamento nas instâncias do futebol para que não se corra, novamente, o risco da FIFA vir punir os atletas, dirigentes e clubes, pelo facto de questões do “desporto rei” serem apreciadas fora dos órgãos jurisdicionais federativos. Ainda no âmbito deste aspecto da questão, há a hipótese dos arguidos invocarem a inconstitucionalidade do DL. 390/91 que, se obtiver provimento por parte do Tribunal Constitucional, “arruma” com a parte mais mediática do processo, tudo se saldando, como já alguém escreveu, por mais um momento de ridículo e descrédito da justiça portuguesa.

    Considerando o prestígio, determinação, conhecimentos e sentido prático que à senhora procuradora--geral adjunta Maria José Morgado são reconhecidos, talvez que da sua argúcia e determinação e da coordenação do trabalho da equipa que vai chefiar na investigação dos processos relacionados com o caso Apito Dourado, rapidamente se separe o “trigo do joio” e se conheça a breve prazo as acusações que venham a ser formuladas, para que os tribunais possam julgar as consequentes causas, o mundo do futebol se acalme, os eventuais promotores e agentes de agressões físicas sejam identificados e julgados e as finanças públicas vejam entrar nos seus cofres impostos que ilegalmente tenham sido sonegados.

    A UNIDADE

    AUTÓNOMA

    Relacionado com todo este “imbróglio” não deixará de ser curiosa a declaração do ministro da Justiça que, sujeito a “bombardeamento” na Assembleia da República, lá fez saltar o coelho da cartola com o anúncio da criação de uma unidade na PJ para combater a corrupção desportiva. A convicção da necessidade e da concretização de tal unidade poderá ser medida pelas respostas que terá dado quando interpelado relativamente aos meios que serão disponibilizados para o anunciado. Parece que a resposta foi algo parecido com: logo se verá, o que denuncia o improviso de medida que antes nunca fora pensada e, consequentemente, ponderada a viabilidade de afectar os parcos recursos da PJ a mais uma unidade “autónoma”. Mas, mesmo que a promessa venha a ser cumprida, sempre ficará a seguinte interrogação: porquê uma unidade autónoma para acompanhar fraudes desportivas, normalmente sem quaisquer consequências para além da esfera dos clubes, seus dirigentes, adeptos e simpatizantes, e não a mesma preocupação para a fraude que prolifera na administração pública?

    Quando o Procurador-Geral da República dá sinais de dispor de poucos recursos para atender às solicitações que decorrem dos sinais da corrupção que prolifera nos diversos departamentos da administração pública, a afectação de uma magistrada de reconhecido valor para se ocupar de questões dos “futebóis” não deixará de gerar no espírito de muitos portugueses o frustrante sentimento de que o combate à corrupção e fraude, que tolhem o desenvolvimento do país, apenas tenha como resultado a prisão de alguns “pobres”, como há dias admitia o advogado e jornalista António Marinho, quando no programa da SIC Notícias, “Expresso da Meia Noite”, lembrava que as prisões estão cheias, mas nenhum dos reclusos identificado com o crime de colarinho branco.

    Alinhemos, contudo, com os que admitem que com a nomeação e posse do actual Procurador-Geral da República as coisas se irão alterar radicalmente e que a magistrada Maria José Morgado rapidamente suscite a constitucionalidade do DL 390/91 para que o seu labor e o dos seus colaboradores não tenha como destino o caixote do lixo, a Justiça não seja mais uma vez olhada como algo que apenas pune o "pé descalço", e que rapidamente se libertem meios para atacar situações de aparente criminalidade bem mais importante, que passeie nos gabinetes ministeriais, nas autarquias e nos aparelhos partidários.

    Por: A. Alvaro de Sousa

     

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