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    Arquivo: Edição de 10-12-2010

    SECÇÃO: Opinião


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    O que os controladores aéreos espanhóis ensaiaram

    Os aeroportos de Madrid, Palma de Maiorca e Santiago de Compostela, bem como os espaços aéreos de Madrid e de Ilhas Balneares, retomaram o seu normal funcionamento, depois de terem estado encerrados devido à não comparência dos controladores espanhóis nos seus locais de trabalho, o que foi apelidado de “greve selvagem” por ter faltado o aviso prévio. A inusitada acção dos referidos trabalhadores terá provocado transtornos a mais de meio milhão de pessoas e prejuízos calculados em muitos mais milhões de euros. A TAP queixa-se de custos acrescidos e de perda de receitas, tudo calculado em cerca de um milhão de euros de prejuízo. Naturalmente que nos solidarizamos com todos quantos sofreram as consequências do referido episódio, mas, em igual medida, compreendemos o gesto dos controladores que, usando os meios ao seu dispor, quiseram, e conseguiram, alertar o poder político de que os direitos dos trabalhadores devem ser respeitados na exacta medida em que os direitos do capital o são.

    Curiosamente, o primeiro-ministro português, mesmo fora do país, apressou-se a condenar a iniciativa dos trabalhadores espanhóis e a adjectivá-la de “greve selvagem” por não ter sido previamente anunciada, e a felicitar o seu camarada espanhol por ter decretado, com efeitos imediatos, o “estado de emergência”, sujeitando os “abstencionistas” a penas de prisão se persistissem na sua ausência ao trabalho.

    Compreendendo o nervosismo de José Sócrates, bem como os recados que aproveitou para enviar aos trabalhadores portugueses, lamento que igual furor não tenha tido, sempre que um qualquer patrão português, e têm sido muitos, sem qualquer aviso prévio, deixa de pagar os salários aos seus trabalhadores, procede a despedimentos por SMS, encerra (à má fila) as portas dos locais de trabalho, retira os equipamentos sempre que pode, mesmo que tenha de recorrer ao uso da violência policial, deixando na maior consternação quem, vivendo do seu trabalho, não raramente dedicou toda a sua vida a criar riqueza que, num ápice, desaparece sob acção patronal para não responder pelas suas obrigações sociais, mas deixando acauteladas as necessárias condições para continuar a desfrutar do mesmo nível de vida que exibia antes de “atirar” para o desemprego, a que se seguirá o desespero e a pobreza, dezenas, centenas ou milhares de dedicados trabalhadores, muitos deles com idades que dificilmente lhes permitirão voltar a integrar o mundo do trabalho.

    Com efeito, o que impedirá o governo de promulgar legislação correspondente à aplaudida no caso dos controladores espanhóis, sempre que em Portugal são violados os direitos dos trabalhadores, sujeitando os prevaricadores a penas de prisão? E, por que razão não foi imediatamente produzida legislação que obrigasse a tributar os lucros distribuídos antecipadamente, sob cominação dos autores da “marosca” ficarem sujeitos às medidas previstas no código penal? Terão sido as pressões do capital, a dependência dos políticos aos seus ditames, o risco de inviabilizar negócio que salvará as aparências do prometido défice orçamental de 7,3%? Não sabemos o que terá sido, mas razão considerável foi, tão poderosa que forçou o chefe da bancada parlamentar socialista a ameaçar demitir-se se os seus pares persistissem em aprovar legislação extraordinária para tributar lucros extraordinários, como os classificou o CEO da autora da iniciativa, logo seguido por outros.

    Seja como for, os controladores espanhóis criaram um facto novo nas relações do trabalho, com o capital e o poder. De ora em diante, todos deverão ter presente que não é só a nível militar que se operaram modificações substanciais na condução e execução das guerras, substituindo as trincheiras e frentes de batalha pela guerrilha, também no confronto de associações de trabalhadores com congéneres empresariais, deve ser natural que aquelas usem de expedientes inovadores para combater, em pé de igualdade, práticas que descapitalizam as empresas, fogem às obrigações tributárias, escondem em paraísos fiscais parte substancial do produto do trabalho sem que, até agora, algo de mal lhes tenha acontecido. Pelo contrário!

    Vivemos tempos de mudança. Bom será que não seja apenas para sacrificar direitos sociais.

    Por: A. Alvaro de Sousa

     

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