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    Arquivo: Edição de 28-02-2010

    SECÇÃO: Editorial


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    De cabeça aberta…

    Sem metáforas, às vezes acontece abrir a cabeça de forma involuntária, mas dá que pensar…

    Dantes quando se rachava a cabeça usavam-se ligaduras para segurar os pensos, hoje tudo é mais simples e um mero penteado pode salvar a imagem, independentemente da gravidade do acidente.

    Foi (quase literalmente) de cabeça aberta que li e reli “A Cultura–Mundo: Resposta a uma sociedade desorientada”, de Gilles Lipovetsky e Jean Serroy, a que já fiz referência no último editorial, mas a sua análise social do mundo e em especial de França, cuja situação está tão próxima da de Portugal faz com que não resista a partilhar com os leitores de “A Voz de Ermesinde” mais algumas das suas considerações.

    E porque se aproxima o dia 8 de Março, Dia Internacional da Mulher, é difícil resistir a uma leitura sobre uma outra das suas obras, “A Terceira Mulher. Permanência e Revolução no Feminino”.

    Segundo o autor, a família contemporânea regista «baixa nupcialidade, aumento de divórcios, coabitação pré-nupcial, aumento significativo dos nascimentos fora do casamento e baixa fecundidade. (…) À ordem constrangedora do passado sucedeu a família diversificada, que cada um escolhe, sem modelo nem norma absolutos, em função da sua ideia de felicidade».

    Ainda sobre esta temática considera que a família é arrastada para «um processo de privatização e de desinstitucionalização radical: tornou-se um assunto estritamente afectivo e psicológico, um instrumento de realização pessoal, liberto das exigências de grupo».

    «A família tornou-se incerta, objecto de hesitação, de liberação, de decisão estritamente individual» (1).

    E é nesta entrega a si próprio, livre e senhor de si, que se torna mais «vulnerável, frágil e desarmada interiormente», contribuindo para um isolamento social e afectivo, uma solidão que aumenta em cada dia nas nossas cidades. Nos últimos cinquenta anos a vivência da solidão aumentou significativamente, em França há 8,3 milhões de pessoas que vivem sozinhas, sendo cerca de 5 milhões mulheres.

    Porém não podemos esquecer a profunda transformação que se verificou neste último meio século em relação aos papéis do género, talvez superior à conseguida ao longo de muitos milhares de anos. E é sobre essa transformação que Gilles Lipovetsky reflecte no livro “ A Terceira Mulher”.

    O que ganhou a mulher com esta transformação, era este o caminho iniciado?, a sociedade foi alterando o seu percurso, é possível conciliar na vida de hoje a sua integração num novo mundo com todos os direitos dos homens e continuar a exigir tratamento diferenciado?

    Mas esta igualdade também trouxe consigo outras dificuldades, ambos mandam e isso gera um outro tipo de conflitos que se alargam a um maior número de questões.

    O velho ditado “cá em casa manda ela e nela mando eu” já não faz sentido.

    É neste novo mundo que nos enquadramos e para o qual nos temos de preparar, no entanto falta ainda desbravar muito deste caminho. Hoje há uma maior e melhor consciência destas questões, mas mesmo assim a violência doméstica continua, com incidência cada vez em gente mais jovem, em sociedades com escolaridade obrigatória.

    Portugal é um desses países, por isso faz todo o sentido lembrar a mulher neste 8 de Março que se aproxima.

    E porque os deuses estão zangados com os homens, não posso deixar de lembrar todo o sofrimento das mulheres por este mundo fora e neste momento enviar uma flor às mulheres da Madeira.

    (1) Louis Roussel, “La Famille incertaine”, citado por Gilles Lipovetsky.

    Por: Fernanda Lage

     

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