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    Arquivo: Edição de 30-11-2007

    SECÇÃO: Opinião


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    Problemas estruturais

    Presidente da República e Governo, de quando em vez são assaltados por preocupações resultantes da fraca natalidade e exponencial taxa de desemprego. Mais recentemente, na deslocação que fez por terras da Beira Baixa, o Chefe do Estado português mostrou-se profundamente apreensivo com a falta de crianças no distrito da Guarda, apelando a todas as forças políticas e sociais para fazerem algo no sentido de inverter o sentido da tendência de baixa natalidade que, entre outros problemas, concorre para o despovoamento do interior do país.

    Pelo seu lado, o primeiro-ministro, sempre que a oportunidade se lhe oferece, lá dá sinais de desconforto pelo facto da taxa de desemprego teimar em rondar os 8%, não obstante, segundo diz, terem sido criados milhares de novos postos de trabalho e, em outro registo, numa aparente resposta a declarações do Dr. Mário Soares, afirmar que em nenhum outro governo se fez tanto em defesa dos direitos sociais como no seu. Não sabemos qual a reacção dos seus camaradas, mas queremos acreditar ter havido quem tenha questionado o orador perguntando-lhe se defender direitos sociais é manter o baixo nível salarial, reduzir as pensões de reforma, introduzir novas taxas moderadoras nos hospitais, encerrar Centros de Saúde e, ao que se receia, vir a fazer o mesmo com postos de GNR, PSP e Correios.

    Simultaneamente, os meios de comunicação social alertam-nos para os graves problemas que a sociedade civil enfrenta: indisciplina e insegurança nas escolas, elevada taxa de abandono e fraco índice de aproveitamento escolar, instabilidade económica no seio das famílias com reflexos na agressividade dos casais cujas maiores vítimas são as mulheres, aumento nas consultas de psiquiatria procuradas por cidadãos que se sentem diariamente violentados nos seus direitos, suportando as mais variadas e sibilinas agressões patronais (assédio moral), num esforço hercúleo de tentarem manter o posto de trabalho, os casais obrigados a “depositarem” os filhos em infantários ou em centros de actividades de tempos livres (ATL´s). Enfim, uma panóplia de dificuldades com que os portugueses se debatem, que deveriam ser melhor resolvidas pelos governantes.

    Relacionado com esta matéria e num tempo em que as novas tecnologias aumentam os lucros empresariais, reduzem o emprego e afectam negativamente a Segurança Social, não será descabido recordar três episódios. Um datado de finais do século XVIII, e dois nossos contemporâneos. O primeiro está associado ao invento da máquina a vapor que provocou mudanças profundas nos meios de produção humanos até aí conhecidos, afectando os modelos económicos e sociais de sobrevivência das pessoas em praticamente toda a Europa. Tratou-se de um progresso tecnológico que deu lugar ao aparecimento de equipamentos de produção em série acabando com os artesões. Como segundo escolhemos o empresário italiano Enzo Rossi, que decidiu experimentar viver com 1 000 euros, tanto quanto pagava aos seus empregados. Chegado ao dia vinte, depois de várias restrições, conclui envergonhado que os seus mil euros, mais os mil euros de sua mulher tinham acabado, declarando que se ele não vivia bem com tal rendimento, os seus colaboradores passariam o tempo stressados psicologicamente, afectando a produtividade e a qualidade do produto (maccheroncini, um tipo de macarrão finíssimo). Resultado, aumentou os salários em vinte por cento. O último dos três acontecimentos, prende-se com a entrevista do Dr. Mário Soares, onde apela para que o PS passe a governar um pouco mais à esquerda, declarando-se desapontado com o agravamento do fosso entre os muito ricos e os muito pobres. Dizia ele que, quem como ele sonhou com um Portugal diferente depois da Revolução dos Cravos, é chocante ver como as desigualdades sociais se agravaram nos últimos tempos. Desapontamento semelhante revela o Coronel Jaime Neves no DN, quando desabafa que “não foi para isto que fizemos o 25 de Novembro”.

    Analisando cada um dos referidos acontecimentos, poderíamos ser tentados a pensar que com o aumento da produção e da produtividade resultantes das máquinas, as pessoas tivessem participado, imediatamente, no aumento da riqueza que passou a existir com a introdução dos equipamentos industriais movidos a vapor. Mas não foi assim. No início, o excesso de mão-de--obra proveniente do desaparecimento dos artesões proporcionou aos patrões imporem condições duras de trabalho sem reflexos nos salários, tendo-se chegado ao ponto de em algumas fábricas a jornada diária ultrapassar as quinze horas, sem tratamento diferenciado para mulheres e crianças, realidades que deram lugar a graves e dolorosas convulsões sociais com alguns trabalhadores enforcados.

    A PROMISCUIDADE

    DO POLÍTICO

    COM O ECONÓMICO

    Quanto ao segundo, também muitos dos nossos empresários deveriam experimentar viver com os 403,00 euros que pagam à maioria dos seus trabalhadores e com o stress permanente de não saber se o seu contrato a termo se manterá para lá da data inicialmente estipulada. Se o fizessem, como o seu colega italiano ensaiou, certamente que, também como ele, subiriam os salários e transformariam os contratos a termo certo em contratos sem termo predefinido, na certeza de que passariam a dispor de um conjunto de colaboradores cada ano mais bem preparados tecnicamente, orgulhosos por contribuírem para o sucesso da sua empresa, estimulados com o reconhecimento patronal, tudo redundando em aumento de lucros, desenvolvimento empresarial e crescimento sustentado da economia nacional.

    Relativamente ao desalento do nosso ex-Presidente da República e do nosso “lendário” Coronel, algumas referências insertas na “separata” do Público onde são listadas as 1 000 maiores empresas operando em Portugal dão-nos a conhecer algumas realidades responsáveis pela baixa natalidade, pelo stress em que vivem os trabalhadores portugueses e os resultados da política de baixos salários praticada entre nós.

    Com efeito, pode ler-se logo no início da citada publicação que: «Em 2006 a economia portuguesa cresceu 1,3 por cento e o desemprego agravou-se. Mas as 1 000 maiores empresas nacionais registaram um desempenho bastante mais positivo. Em especial as 50 maiores ao responderem por praticamente metade das vendas totais. No global, os lucros subiram 25%».

    Com este cenário, muito em resultado da aplicação das novas tecnologias, não seria possível reduzir o número de horas de trabalho e aumentar os salários pagos sem pôr em causa a solvabilidade das empresas? Certamente que sim. Mas a “gula” dos lucros e a promiscuidade do político com o económico impedem que se mude de paradigma, resultando em consequência que o número de desempregados não sofra redução substancial, que a qualidade de vida dos portugueses não descole da cauda do ranking europeu, que as famílias não se atrevam a aumentar o seu agregado, que os trabalhadores por conta de outrem vivam angustiados com a incerteza do dia seguinte. Perguntar-se-á, como querem resolver o problema de excesso de mão-de-obra se teimam em não reduzir a jornada de trabalho? Esperando por novas guerras?

    Perceba-se a tempo que as consequências de actos desesperados e descontrolados de quem nada tem a perder, porque tudo lhes foi tirado ou negado, é bem pior que os benefícios da prática de transformar as empresas em centros de justiça social. Voltar à teoria económica de Adam Smith será o regresso ao capitalismo selvagem e a novas e mais sangrentas revoluções sociais que as dos séculos XVIII e XIX.

    Por: A. Alvaro de Sousa

     

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