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    Arquivo: Edição de 15-10-2007

    SECÇÃO: Crónicas


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    Ronda das Ilhas Gregas (2)

    Diz-se que “a descer todos os santos ajudam”, o que nem sempre pode ser entendido à letra.

    Foi-o, certamente, para Fernão Veloso quando, correndo monte abaixo, escapava aos perseguidores etíopes o que motivou a chalaça de um companheiro tão logo o recolheram num batel, como relata Camões no Canto V de “Os Lusíadas: “Olá, Veloso amigo, aquele outeiro/ É melhor de descer que de subir…” (estrofe 35). O regresso ao cais de Santorini era uma longa descida. Não tínhamos a mesma urgência que o marinheiro de Vasco da Gama, valha-nos isso! Lá em baixo, esperava--nos a lancha que faria o percurso até ao navio, ancorado a meia milha, e nada havia a recear desde que cumpríssemos o horário estabelecido.

    É claro que seria mais rude a descida se percorrêssemos a estradazinha que ao alto nos conduziu. Bem mais cómodo se afigurava, todavia, a viagem pelo funicular que, de acréscimo, nos permitiria uma vista deslumbrante sobre a ilhota fronteira onde está a cratera do vulcão. Optámos pelo bucólico passeio a pé, percorrendo cerca de seiscentos e sessenta degraus, sob uma temperatura de 46 a 48 graus centígrados. Outros fizeram-no em lombo de burro ou de mula. Admito que havia outra forte razão em desfavor da nossa escolha: para gente de melindrosas pituitárias, o caminho, atapetado de excrementos dos referidos quadrúpedes, estava longe de ser atractivo. Os gregos encontraram uma boa solução para transporte dos turistas, aqui como noutras ilhas do Mar Egeu. Em Lindos, na ilha de Rodes, pode tornar--se mais suave a elevação à Acrópole alugando um desses úteis animais ao invés de arrostar com um percurso de inclinação capaz de desmotivar quem, nos países do ocidente, se habituou ao conforto da vida citadina.

    A etapa seguinte era precisamente Rodes, que nós já conhecíamos e de que já falei em Maio do ano passado. Então, não pudemos visitar a Acrópole de Lindos, porque se encontrava encerrada para conservação. Fizemo-lo desta vez e não nos desiludiu. A cidade é pequena mas está muito bem localizada e a vista da Acrópole, dominando a baía, as praias e a imensidão de azul intenso até à fímbria do horizonte, é de cortar a respiração. Não admira que daqui tenham saído grandes artistas plásticos como Chares a quem se atribui a autoria do célebre Colosso de Rodes e outros cujos nomes a história não guardou, porque, nessa época, o trabalho dos artistas não era valorizado como acontece actualmente. A célebre escultura de Laocoonte devorado pelas serpentes, que pode ser admirada no Museu do Vaticano, foi executada por três artistas da ilha de Rodes, possivelmente daqui naturais. Sabe-se que esta cidade foi famosa pelo seu desenvolvimento cultural em particular nas artes e na literatura durante o período clássico da civilização grega e na época helenística. O monte em que se ergue a Acrópole nada fica a dever ao de Atenas e o conjunto de monumentos nele construídos ao longo dos séculos, alguns bem preservados, são de uma beleza impressionante. No cume do monte, a 116 metros de altitude, foi erigido um templo em honra de Atena Lindos, protectora da cidade. Ao longo dos séculos e com as mudanças históricas operada, desde a era do bronze, passando pelo período clássico, pelo helenismo, mais tarde pelo domínio de Bizâncio e pelo dos cavaleiros, foram sendo erguidos templos aos deuses da Grécia, uma igreja bizantina, uma poderosa fortaleza em torno do monte. À entrada da Acrópole, pelo lado norte, foi gravada na muralha, no segundo século antes de Cristo, a popa de um navio trirreme de 4,76 de comprimento por 5,50 de altura e que fornece aos estudiosos importantes informações técnicas sobre a constituição destes barcos arcaicos. Logo após a primeira porta, há uma escada, já reconstruída, de 80 degraus que conduz ao topo do conjunto. Fora das muralhas, na vertente ocidental do monte, está encravado na rocha o teatro antigo.

    Ao terceiro dia, chegámos a Mikonos, hoje uma das mais belas e procuradas ilhas do Mar Egeu. Mas nem sempre foi assim. Até há poucos anos, era quase desconhecida e frequentada somente pelos gregos endinheirados do continente que ali usufruíam de férias paradisíacas. Os seus habitantes, pouco numerosos, viviam pobremente e apenas dos recursos da terra e do mar. Também aqui a indústria turística transformou o local num dos mais atraentes destinos de férias para gente de todo o mundo. Além da sua beleza natural, o que começou por atrair os visitantes foi a pequena ilha de Delos onde, segundo a mitologia grega, nasceu Apolo fruto de uma das várias infidelidades de Zeus, desta vez com Leto. Hera, esposa de Zeus, invadida pela cólera, ao saber da traição, ordenou a todas as terras que recusassem hospitalidade a Leto. Zeus pediu ajuda a Poseídon que, com o seu tridente, feriu o mar no meio das ilhas Cíclades e uma pequena ilha rochosa surgiu das vagas. Foi ali que Leto encontrou refúgio para dar à luz os filhos Apolo e Artemisa. A origem deste mito será, porventura, o facto de Delos ser inundada pelo sol desde a aurora até ao crepúsculo mas que, apesar disso, se encontra em ruínas há séculos. Outra variante do mito reza que Delos era uma parte da Sicília que errava pelos mares meio engolida pelas ondas. Quando Zeus intercedeu junto de Poseídon, este fê-la emergir entre as Cíclades. A ilha deixou de flutuar sobre os mares, porque colunas de diamantes vieram sustê-la e fixá-la neste lugar. Apolo tornou-se o protector de Delos que se desenvolveu e se tornou um centro comercial próspero ao longo de muitos séculos. Hoje, ali, só há ruínas.

    Mas Mikonos não é conhecida apenas pelo que encerra de mitológico. È também uma ilha lindíssima onde a profusão de flores e de cores emociona vivamente quem a visita. Com efeito, pelas ruelas típicas, abundam flores nos pequenos jardins fronteiros, em vasos sobre os muros e nas janelas, transportadas em cestos de madeira ou de vime sobre o lombo dos jumentos, tornando ainda mais alegre o conjunto de casas de deslumbrante alvura com portas, janelas e portadas predominantemente azuis. Em nenhum lugar da ilha se encontram casas degradadas, ao contrário, todos renovam as pinturas das suas habitações que parecem acabadas de construir. Nas colinas vêem-se moinhos de vento e gente ocupada nos seus mesteres. Há centenas de casas comerciais com artigos interessantes, muito criativos e em conta. As praias e toda a orla litoral apresentam uma vida intensa durante todo o ano, razão pela qual esta ilha se tornou destino turístico de excelência.

    Por: Nuno Afonso

     

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